Lançamento e-book “Estrutura urbana e mobilidade espacial nas metrópoles”
O Observatório das Metrópoles lança o e-book “Estrutura urbana e mobilidade espacial nas metrópoles”, da pesquisadora Érica Tavares da Silva, mais um resultado do Programa INCT. O livro traz uma importante contribuição sobre a longa transição urbana por que passa a sociedade brasileira no período pós os anos 1970. A autora mostra a total superação da tese da explosão populacional como geradora dos problemas das grandes cidades brasileiras. O que se vê após 1980 é a organização do conflito por invisíveis práticas de lutas para apropriar-se da cidade, não só estar nesse espaço, mas conseguir viver plenamente, aproveitando as condições que lhe são próprias.
O e-book “Estrutura Urbana e Mobilidade Espacial nas Metrópoles” traz os resultados da tese defendida pela pesquisadora Érica Tavares da Silva em 2012 no âmbito do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ), sob a orientação do professor Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro. A tese recebeu a Menção Honrosa do Prêmio Capes de Tese 2013 na área de Planejamento Urbano e Regional/Demografia.
“Este trabalho não alcançaria o êxito que obteve se não fosse empreendido no contexto de uma rede de pesquisa que possibilita a circulação de informações, dados, reflexões, enfim, conhecimento. É nesse sentido que foi possível utilizar diversos suportes teórico-metodológicos que já são desenvolvidos no Observatório das Metrópoles, como os estudos da hierarquia urbana e integração metropolitana e da organização social do território, amplamente utilizados para análise da mobilidade espacial, através das migrações e dos movimentos pendulares, permitindo lançar interpretações de cunho social sobre esses processos. Ou seja, no Observatório, foi possível valer-se de uma inteligência coletiva que se constituiu num suporte virtuoso para o desenvolvimento de um trabalho individual”, afirma Érica e completa.
“A indicação do IPPUR tem um significado muito importante na minha trajetória acadêmica, é fruto do reconhecimento de quatro anos de intenso trabalho em pesquisa e reflexão, em que buscamos relacionar a problemática urbana e demográfica, de um ponto de vista também sociológico. Demonstra também que os resultados obtidos são importantes para pensar a dinâmica urbana atual e os movimentos populacionais no espaço, através da identificação de distintas lógicas de mobilidade espacial nas metrópoles, sendo possível indicar que essas lógicas passam tanto por perspectivas de escolha como de constrangimento”.
APRESENTAÇÃO
Por Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro
Este livro, decorrente da tese de doutoramento de Érica Tavares da Silva, coloca à disposição do público acadêmico importante contribuição à compreensão da longa transição urbana por que passa a sociedade brasileira no período pós os anos 1970. A partir de diversificados e convincentes fundamentos empíricos, gerados pelo uso de dados do IBGE e pela aplicação de sofisticados procedimentos técnico e metodológico, a autora empreende uma competente análise das mudanças sócio-demográficas do fenômeno metropolitano brasileiro. Deixa evidente a total superação da legitimidade da demoteoria como explicativa dos desafiadores problemas das nossas grandes cidades, segundo a qual a precariedade urbana, a desigualdade de acesso aos serviços coletivos, a ilegalidade e irregularidade habitacional, a segregação residencial, enfim, todas as marcas da nossa incompleta sociedade urbana teria como causa central a explosão populacional.
Ao acionar de maneira competente e criativa os conhecimentos adquiridos em campos disciplinares distintos – sociologia, demografia e planejamento urbano – e tornando os fenômenos demográficos em objeto sociológico, Erica Tavares nos propõe a interessante reflexão sobre os sinais de mudanças da natureza do conflito social nas metrópoles, como chave do entendimento da transição urbana em curso. Se no momento do crescimento acelerado dos anos 1950, 1960 e 1970 os movimentos populacionais que metrourbanizaram o Brasil se expressavam na busca do estar na cidade, do se assentar na cidade, para entrar na sociedade moderna, para largas parcelas das camadas populares após 1980 o conflito se organiza por surdas e invisíveis práticas de lutas para apropriar-se da cidade como forma de permanecer nesta sociedade e desfrutar daquilo que David Harvey chamou de renda real: bem-estar, renda e oportunidades. Luta que tem como objeto a apropriação das chances de mobilidade urbana no vasto e desigual espaço social das metrópoles. Filtrando socialmente, sobre tais chances atuam, simultaneamente, a estrutura social e sua hierarquia posicional, o sistema de transportes e a sua desigualdade de modalidades, custos e de qualidade, e o crescente descasamento espacial entre a localização do emprego e da habitação.
Dimensão demográfica
A primeira parte do livro “Estrutura Urbana e Mobilidade Espacial nas Metrópoles” aborda justamente o processo histórico de urbanização e metropolização no Brasil e as perspectivas teórico-conceituais que contribuem para a análise da estrutura urbana em sua articulação com a dinâmica demográfica e os movimentos populacionais. É realizada uma contextualização do processo de urbanização brasileiro, a precoce metropolização, a relação da dinâmica demográfica com a dinâmica econômica e urbana, avaliando a expressividade das metrópoles na constituição do sistema urbano brasileiro. Para tanto, realiza-se uma retomada do processo de urbanização marcado pela velocidade, já que na segunda metade do século XX, a população urbana passou de quase 19 milhões para 138 milhões, e pelo caráter notavelmente metropolitano, fazendo praticamente coincidir no tempo e no espaço urbanização e metropolização.
A dinâmica populacional metropolitana no contexto atual também é analisada, avaliando os processos de concentração e dispersão populacional nas metrópoles. Observa-se que a população urbana passou a apresentar significativas mudanças de localização, de movimentação e de acesso aos serviços e à cultura urbana nas cidades, com impactos expressivos na dinâmica demográfica do país. Essas dimensões históricas são muito importantes para se compreender o contexto atual, especialmente quando o trabalho aborda os movimentos populacionais no Brasil, as mutações ocorridas tanto nos volumes e trajetórias quanto no significado dessa mobilidade na estruturação do espaço urbano.
“É sob essa contextualização que pretendo retomar a importância da relação complexa entre as dinâmicas demográfica e urbana. (…) Aponta-se que a demografia não é apenas mais uma dimensão para ilustrar processos que ocorrem no espaço urbano, partimos do pressuposto de que a dinâmica demográfica é em si mesma um processo social que interfere na organização social do espaço urbano, sendo também por ela influenciada, apresenta implicações bastante significativas para refletirmos sobre qual tipo de espaço urbano e metropolitano teremos num futuro próximo”, explica Érica Tavares.
Objetivos
O objetivo geral do trabalho foi analisar os movimentos populacionais em sua relação com a estrutura urbana, reflexão esta fundada na compreensão da relação entre dinâmica urbana e dinâmica demográfica, ou seja, como expressão das estratégias (individuais e coletivas) e os constrangimentos (capital social, mercado imobiliário, sistemas de acessibilidade, políticas urbanas e habitacionais, etc.) que se colocam às práticas de apropriação da cidade. A justificativa para tal objetivo se deve justamente às mudanças ocorridas nos movimentos populacionais e à emergência de estudos que apontam novos padrões de mobilidade espacial principalmente nos grandes espaços urbanos metropolizados. Portanto, a questão está em responder em que medida há novos processos de mobilidade espacial nas metrópoles (como maior migração no interior dos estados, suburbanização e/ou mobilidade pendular para grupos sociais mais abastados, etc.), ou permanecem lógicas anteriores (como migração de longa distância, periferização no interior das metrópoles, etc.). Por essa razão, a investigação se dá a partir de um recorte metropolitano, considerando várias metrópoles brasileiras na segunda parte da tese, posteriormente focando-se somente na metrópole do Rio de Janeiro na terceira parte.
Direito de se apropriar da cidade
Entre as dimensões demográficas, Érica Tavares da Silva trabalha no livro especialmente com a mobilidade espacial. A principal justificativa para privilegiar esta dimensão, segundo ela, decorre da compreensão, fundada na literatura, sobre as fases da relação entre demografia e urbanização. No período do acelerado crescimento das cidades, os movimentos migratórios constituíam-se num processo social envolvendo grandes massas populacionais, geralmente em direção à Região Sudeste do país, notadamente nas metrópoles paulista e fluminense – fato que predominou até os anos 1970 aproximadamente.
A partir desse período, com as mudanças ocorridas na dinâmica econômica, desconcentração da estrutura produtiva, condições sociais e econômicas mais adversas especialmente nas metrópoles, esses movimentos reduziram-se consideravelmente, passando a ganhar notoriedade movimentos no interior dos estados, movimentos intrametropolitanos e os movimentos pendulares. O interesse em estudar estes últimos decorria de análises sobre as próprias condições sociais, econômicas e demográficas existentes nos aglomerados urbanos, especialmente pela espacialização dessas condições, evidente com os processos de periferização nas grandes metrópoles.
As questões que este trabalho suscita na análise da mobilidade espacial passam justamente por essa relação entre a dinâmica populacional e urbana. Nesse sentido, as teorias da transição demográfica e da transição urbana foram pontos de partida interessantes. Num primeiro momento, os movimentos populacionais expressavam uma busca por “estar na cidade”, característica da primeira fase da transição urbana associada à transição demográfica no caso do Brasil, evidente especialmente pelos enormes contingentes populacionais que se dirigiram para o espaço urbano; num período posterior, os movimentos populacionais passam a revelar uma “busca por apropriar-se da cidade”, não só estar nesse espaço, mas conseguir viver plenamente, aproveitando as oportunidades que lhe são próprias – como condições de infraestrutura, acesso a bens e serviços públicos e privados, inserção no mercado de trabalho urbano, moradia adequada, etc. É por isso que a localização residencial no espaço urbano e sua relação com a inserção no espaço social estão relacionadas a inúmeras características dos indivíduos – como sua origem, qualificação, ocupação, etc. – mas também aos elementos da estrutura urbana – as características do espaço, o acesso à moradia, ao trabalho, aos bens e serviços urbanos. As chances de mobilidade, de deslocar-se no espaço, também parecem cruciais nessa relação.
Faça o download do e-book “Estrutura urbana e mobilidade espacial nas metrópoles”.
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