No processo de viabilização da Copa no Brasil, ganharam os grupos hegemônicos e perderam os grupos hegemonizados. Resta dimensionar que jogo de forças queremos priorizar em nossa sociedade, quem queremos empoderar e quem queremos refrear. Essa é uma questão que merece ampla reflexão, sobretudo porque, depois da Copa virão as eleições.
A análise “Depois da Copa” da professora e coordenadora do Núcleo Curitiba do Observatório das Metrópoles, Olga Firkowski, foi publicada no Jornal Gazeta do Povo no dia 06 de julho de 2014 como parte do texto “Sucesso em campo, legado incompleto”. A crítica faz parte das ações da equipe do projeto “Metropolização e Megaeventos: os impactos das obras da Copa do Mundo nas metrópoles brasileiras” com o objetivo de difundir os resultados da pesquisa para a sociedade civil e veículos de mídia.
A professora Olga Firkowski tem participado de modo frequente no diálogo com os formadores de opinião do Paraná, especialmente como colaboradora no jornal Gazeta do Povo.
A seguir a análise.
Depois da Copa
Olga Lúcia Castreghini de Freitas Firkowski*
Embora entrando agora na fase mais frenética do ponto de vista esportivo, restam apenas quatro jogos em quatro cidades, ainda é cedo para avaliações mais consistentes sobre os resultados no campo das transformações urbanas e da economia.
A agitação dos preparativos deu lugar ao recolhimento das estruturas temporárias, das placas provisórias, dos tapumes, quase não há mais operários nas ruas, as obras foram concluídas total ou parcialmente no mesmo compasso da maioria dos jogos das oitavas de final: nos últimos minutos do segundo tempo ou mesmo na prorrogação.
Que lições tirar para o futuro? A grande expectativa acerca das mobilizações prometidas por distintos segmentos para o período da Copa, não se efetivou, mesmo porque a segurança foi redobrada, inclusive com o exército monitorando as ruas em várias cidades brasileiras.
Novidades na paisagem urbana: novas faixas preferenciais de ônibus surgiram, sinalizadas em verde e amarelo; às vésperas do início dos jogos, o corredor Aeroporto-Rodoviária virou um imenso canteiro de obras, nunca tantos trabalhadores e máquinas foram vistos em ação: asfaltamento de vias, placas de sinalização de trânsito e indicando uso de bicicleta são vistas ao longo de toda sua extensão; caminhões com grama e palmeiras, modificaram a toque de caixa o canteiro central que restou na Av. das Torres.
Não se trata de defender se a cidade ganhou ou se a cidade perdeu. Há ganhos e há perdas, sempre. Talvez o ideal fosse avaliar que segmentos sociais e econômicos ganharam e quais perderam.
No processo de viabilização da Copa no Brasil, ganharam os grupos hegemônicos e perderam os grupos hegemonizados ou, como muito bem afirmou Milton Santos – grande geógrafo brasileiro falecido em 2001 –, ganharam os homens e as firmas do tempo rápido e perderam os homens e as firmas do tempo lento.
Traduzindo, podemos afirmar que ganharam as grandes empresas, que acompanham a Fifa pelo mundo em suas ações, ganharam as empresas nacionais e locais mais bem preparadas para responder às exigências pautadas em padrões internacionais, perderam os pequenos comerciantes e os vendedores ambulantes cuja permanência não foi permitida no entorno da arena; as empresas menores que não conseguem responder às exigências formais de contratação pública.
Resta dimensionar que jogo de forças queremos priorizar em nossa sociedade, quem queremos empoderar e quem queremos refrear. Essa é uma questão que merece ampla reflexão, sobretudo porque, depois da Copa virão as eleições…
*Professora do Departamento de Geografia da UFPR e Coordenadora do Núcleo Curitiba do INCT/Observatório das Metrópoles