A SBPC divulgou nesta segunda-feira, 21 de maio, a “Carta de Pernambuco”, o primeiro documento resultante do ciclo de seminários temáticos “Políticas públicas para o Brasil que queremos”. O documento, preliminar e que deve ser amplamente discutido na comunidade científica e acadêmica, traz doze pontos essenciais para políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação que possam recolocar o Brasil nos trilhos do desenvolvimento sustentável.
Os pontos foram discutidos no dia 13 de abril de 2018, no auditório da Fundação Oswaldo Cruz no Campus da Universidade Federal de Pernambuco em Recife.
“Estes pontos constituem uma proposta preliminar de agenda mínima para ser discutida com as instâncias da SBPC, com outras sociedades científicas e com os demais setores da sociedade de modo a constituir a base para o documento sobre políticas públicas para CT&I a ser entregue aos candidatos à Presidência da República”, descreve a SBPC na carta.
Organizado em oito encontros em seis capitais do País, os seminários temáticos têm como objetivo de discutir pontos essenciais para as políticas públicas nas áreas de ciência, tecnologia e inovação, educação básica, educação superior e pós-graduação, democratização da comunicação, direitos humanos, desenvolvimento sustentável, Amazônia e saúde pública.
O objetivo de cada encontro é a elaboração de um documento com diretrizes e propostas gerais para tais políticas. Elas serão apresentadas e debatidas em painéis durante a 70ª Reunião Anual da SBPC, que será realizada em Maceió, de 22 a 28 de julho, no campus da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Serão também divulgadas para a sociedade e encaminhadas aos candidatos ao Legislativo e ao Executivo da próxima eleição.
Leia a carta na íntegra:
“CARTA DE PERNAMBUCO”
“POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O BRASIL QUE QUEREMOS”
DOCUMENTO RESULTANTE DO SEMINÁRIO TEMÁTICO DA SBPC
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) completa 70 anos em julho deste ano. Sua consistente trajetória em defesa do desenvolvimento científico da nação exige que ela alerte toda a população brasileira para a atual destruição em curso do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), construído a duras penas por várias gerações de brasileiros e brasileiras. Laboratórios, escolas, universidades, institutos federais e institutos nacionais estão sendo sucateados ou estão até mesmo na iminência de serem fechados. Desapareceu o ministério integralmente dedicado à C&T e o orçamento para investimento nessa área voltou a níveis de 2002, valor reduzido a 1/3 do que foi aplicado oito anos atrás. Os atuais cortes drásticos nos recursos para CT&I, após mais de uma década de aumento significativo, colocam todo esse investimento anterior, em recursos e em pessoal qualificado, em risco. Estão ameaçadas a continuidade das pesquisas e a formação de novos cientistas.
Isto significa que o futuro do Brasil está em jogo, já que ciência e tecnologia é um fator do qual depende o desenvolvimento econômico e social de qualquer nação contemporânea. É necessário que se estabeleçam, em futuro próximo, políticas públicas que tenham a ciência e a tecnologia como elementos essenciais de um processo de desenvolvimento sustentável, que conduza ao aumento da riqueza nacional, que deve ser repartida de forma menos desigual, e da qualidade de vida da população estabelecendo um equilíbrio entre o econômico, ambiental e social.
Diante deste cenário, em um ano de eleições amplas no âmbito executivo e legislativo, tanto a nível federal quanto estadual, é essencial que a comunidade científica brasileira, por meio de sua entidade científica mais ampla e abrangente, a SBPC, aponte com nitidez os caminhos que vislumbra para reverter a grave crise atual.
No dia 13 de abril de 2018, no auditório da Fundação Oswaldo Cruz no Campus da Universidade Federal de Pernambuco em Recife, a SBPC promoveu um seminário temático para debater políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação que possam recolocar o Brasil nos trilhos do desenvolvimento sustentável. Foi o primeiro de oito seminários temáticos da SBPC, da série “Políticas Públicas para o Brasil que Queremos”, que serão realizados neste semestre em diversos estados brasileiros.
Ao longo de um dia de intensos debates, DOZE PONTOS essenciais para a reconstrução da ciência brasileira foram levantados:
A recriação do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação inteiramente destinado a esta área. Ele deve estar articulado e apoiar os órgãos de CT&I estaduais e municipais e, em especial, as Fundações de Amparo à Pesquisa que estão em grave crise;
A revogação da Emenda Constitucional 95 (a chamada Lei do Teto) ou a sua alteração radical;
O impedimento de contingenciamento dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e a recuperação paulatina dos recursos já contingenciados. O uso adequado e o acompanhamento permanente de todos os fundos públicos de apoio a atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D);
A recuperação dos níveis orçamentários de investimento em CT&I ao valor máximo do período 2009-2014;
O estabelecimento da meta de investir 2,0% do Produto Interno Bruto nos recursos para P&D nos próximos anos, com um planejamento efetivo para alcançar a meta;
O apoio e o fortalecimento dos programas e instrumentos essenciais à C&T, como os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs), o Edital Universal e o Programa de Infraestrutura da Finep (PROINFRA), bem como a consolidação e modernização de centros nacionais de equipamentos multiusuários;
O cumprimento dos acordos internacionais em andamento na área cientifica e o apoio à participação do Brasil nos grandes programas internacionais de pesquisa que forem julgados adequados para o País;
A efetiva aplicação nos níveis federal, estadual e municipal, do novo Marco Legal de CT&I, e o seu aprimoramento, a partir da avaliação de seu funcionamento. Remoção ou aperfeiçoamento de outras legislações que dificultem a realização de pesquisas científicas e tecnológicas;
A construção de um Plano Nacional de CT&I, com prioridades conectadas com as grandes questões nacionais, e o estabelecimento de projetos mobilizadores nacionais, em articulação com uma política industrial moderna e com o apoio a processos e investimentos em inovação nas empresas. O Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) deve ser o órgão articulador desse Plano, que deve destacar o papel decisivo das estruturas estaduais e regionais de CT&I;
A melhoria da qualidade da educação em todos os níveis, em particular a educação científica, com a valorização salarial e simbólica do professor da educação básica, a utilização de metodologias de ensino baseadas na investigação e o uso adequado de política de cotas;
O estabelecimento de gestões públicas que levem em conta os resultados provenientes do conhecimento científico, respeitem o meio ambiente e promovam a inovação e a inclusão sociais;
A defesa da soberania nacional em questões estratégicas como a Petrobrás, a exploração do pré-sal, as fontes de energia solar e eólica, a indústria aeronáutica nacional, a política espacial brasileira, e o Marco Civil da Internet.
Uma demanda especifica de Pernambuco e do Nordeste foi também considerada importante: a reativação da representação do MCTI no Nordeste, que possui um Conselho Consultivo envolvendo universidades, instituições de pesquisa, setor industrial privado etc., para traçar planos para o desenvolvimento da região.
Estes pontos constituem uma proposta preliminar de agenda mínima para ser discutida com as instâncias da SBPC, com outras sociedades científicas e com os demais setores da sociedade de modo a constituir a base para o documento sobre políticas públicas para CT&I a ser entregue aos candidatos à Presidência da República. Documentos similares, tendo tais pontos como referência, serão também construídos coletivamente e apresentados aos candidatos ao Congresso Nacional e também aos candidatos ao Executivo e ao Legislativo na escala estadual. Para que tais ações ganhem maior amplitude, é essencial uma aproximação entre a comunidade científica e suas entidades com os movimentos sociais e com outros setores organizados da sociedade brasileira.
As eleições de 2018, que devem ser efetivamente livres e democráticas, desempenharão um papel crucial para a definição dos rumos do Brasil no século 21. Em função das decisões governamentais em curso, corre-se o sério risco de desnacionalização de recursos e cérebros. É imperativo que os candidatos a cargos eletivos se pautem por uma agenda político-científica-tecnológica capaz de reverter o atual curso de desmontagem do sistema nacional de CT&I. A SBPC se posiciona em defesa das conquistas científicas e educacionais da nação, e conclama todas e todos a esse debate.
Durante o seminário temático a grande maioria dos participantes expressou também sua preocupação com a situação geral no País, na qual a CT&I está inserida, e com os graves retrocessos vivenciados recentemente nos campos social, ambiental, econômico e político, como resultado de ações de um governo que não tem o respaldo do povo brasileiro para alterações tão drásticas na legislação e nas políticas públicas. Tais preocupações se estenderam para os direitos civis que devem existir e serem efetivos em uma democracia. A Constituição brasileira deve ser respeitada por todos os poderes, inclusive o Poder Judiciário, e todos os cidadãos, em particular os gestores, os políticos e os candidatos, de todas as vertentes, devem ser tratados com os mesmos direitos e garantias constitucionais, o que não vem ocorrendo.
Para mais informações, acesse o SITE DA SBPC.
***Com informações do Jornal da Ciência.