Tida como o maior projeto de intervenção urbana da América Latina, a Operação Urbana Consorciada daRegião do Porto do Rio de Janeiro, uma parceria entre o poder público e a iniciativa privada conhecida pelonome fantasia de Projeto Porto Maravilha, vem, sob o álibi da chegada dos megaeventos esportivos à cidade e do discurso que tenta ver na chamada economia criativa a oportunidade para se robustecer as economias locais, transformando a região portuária numa espécie de câmara de decantação das práticas urbanasneoliberais adotadas em várias metrópoles do mundo. Neste artigo para a Revista e-metropolis, Ruy Sardinha Lopes e Natália Pauletto Fragalle refletem sobre os modos pelos quais tais práticas são aqui adotadas e os revezes que vêm causando sobre aqueles que estão submetidos à sua ênfase predatória.
O artigo “Rio Criativo: o projeto Porto Maravilha em questão”, assinado por Ruy Sardinha Lopes e Natália Pauletto Fragalle, é um dos destaques da Revista e-metropolis nº 26.
Ruy Sardinha Lopes é professor e pesquisador do IAU-USP, pesquisador do NEC-USP e vice-presidente da SOCIOCOM. E Natália Pauletto Fragalle é graduanda no IAU-USP.
ABSTRACT
Considered the largest urban intervention project in Latin America, the ‘Operação Urbana Consorciada da Área de Especial Interesse Urbanístico da Região Portuária do Rio de Janeiro’ or ‘Urban Operation in the Rio de Janeiro Port Area’, a partnership between the public and private sectors known by the trade name of PORTO MARAVILHA PROJECT (freely translated as ‘Wonder Port Project’), comes under the alibi of the mega sporting events’ arrival to the city and the discourse that tries to find in the so-called creative economy the opportunity to strengthen local economies, transforming the port area in a kind of a chamber that gathers neoliberal urban practices adopted in various cities of the world. This article aims, therefore, to reflect on the ways in which such practices are adopted here and the setbacks that are being caused on those who are subject to its predatory emphasis.
INTRODUÇÃO
Por Ruy Sardinha Lopes e Natália Pauletto Fragalle
Em um momento no qual a cultura e a criatividade se tornaram commodities e as cidades competem entre si para sediarem megaeventos que atraiam a atenção mundial e, consequentemente, grandes investimentos, o Rio de Janeiro parece finalmente ter atingido esse grande objetivo. Após ter realizado um primeiro ensaio com a vinda dos Jogos Pan Americanos de 2007, a cidade está sendo palco dos dois maiores eventos esportivos mundiais: a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas que ocorrem em 2016, constituindo a oportunidade ideal para a megapromoção da cidade, tida, agora, como “ criativa” e “ inovadora”.
As origens desta megaoperação de image-making podem ser remetidas a um modelo de gestão urbana iniciado entre as décadas de 1980 e 1990, o Planejamento Estratégico1, que implica uma parceria entre os setores público e privado e tem como objetivo construir ou modificar a imagem de uma cidade de modo a promovê-la interna e externamente (Borja, 1996). Essa elaboração de uma city image se dá através de um conjunto formado por três analogias paradoxais: a cidade como mercadoria a ser “ vendida” , competindo com as outras cidades; a cidade como empresa, com a necessidade de ser “ gerida” como tal; e a cidade como pátria, com a qual os seus habitantes se identificam (Vainer, 2000). O Planejamento Estratégico também está ligado a uma valorização do cultural (Arantes, 2000), através da requalificação das áreas urbanas degradadas aliadas à instalação de equipamentos culturais para atrair o capital, desencadeando fenômenos como o da gentrificação, que divide a cidade entre áreas atendidas de forma adequada e áreas abandonadas pelo poder público.
O discurso sobre o Planejamento Estratégico atingiu o seu auge a partir do aparente sucesso do “ modelo Barcelona” , com grande repercussão no Brasil e na América Latina, que utilizou-se da grande inversão de recursos destinados à preparação para os Jogos Olímpicos de 1992 para colocar em marcha um conjunto de projetos de intervenção urbana – já inseridos em um plano da cidade de reestruturação física, econômica e cultural –, adotando um modelo de gestão empresarial competitiva, investindo na promoção de sua imagem no exterior e na construção ou fortalecimento de seus equipamentos culturais e espaços públicos, tornando-se atualmente reconhecida “ como uma cidade cultural por excelência, epicentro de produção criativa e polo de atração de negócios e talentos” 2(Reis, 2009, p.4).
Entretanto, as condições políticas, a conjuntura socioeconômica nacional e internacional etc. fizeram com que as metas previstas nesse modelo de planejamento fossem perdendo fôlego ao longo do tempo, de modo que estaríamos agora assistindo a uma espécie de segundo turno ou retomada das formas de empresariamento da cidade. Não obstante o vínculo inequívoco com tal antecedente histórico, é importante ressaltar a edição de novos elementos, sobretudo um certo deslize semântico que vai do discurso da cidade-mercadoria à cidade-criativa, indicador, em nosso entendimento, dos ajustes espaciais promovidos pelas práticas neoliberalizantes em atuação no país.
Um exemplo paradigmático dessa estratégia, que ilustra como as questões de planejamento estratégico agora somadas ao conceito de criatividade estão sendo aplicados no Brasil, é a revitalização da zona portuária do Rio de Janeiro. Ao se voltar para uma área tida como bastante degradada, mas possuidora, como veremos, de grande potencial “ criativo” , o poder público não vem poupando esforços para convertê-la numa espécie de câmara de decantação dos novos investimentos nacionais e internacionais, constituindo uma espécie de laboratório urbano de atração de capital.
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Acesse o artigo completo da Revista e-metropolis nº 26.