“É constrangedor pensar que precisamos de um álibi – como a Copa do Mundo – para que essas intervenções tenham a mínima possibilidade de sair do papel. Reforma de aeroportos, estruturas viárias, metrôs. Isso tudo não é somente para a Copa. É para o bom funcionamento das cidades!”. Essa é a opinião da professora Olga Firkowski, coordenadora do Núcleo Curitiba do Observatório das Metrópoles, em entrevista para a Revista Ciência Hoje, vinculada à Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
A entrevista da professora Olga Firkowski para a Revista Ciência Hoje faz parte do trabalho que a equipe do INCT Observatório das Metrópoles vem realizando para a difusão dos resultados do projeto “Metropolização e Megaeventos: os impactos da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016 nas metrópoles brasileiras”. Em dezembro de 2013 o instituto promoveu seminário nacional com foco na ampla divulgação para atores governamentais, meio científico, terceiro setor, veículos de imprensa interessados no debate do legado dos megaeventos esportivos.
A professora Olga Firkowski coordena, com o apoio da equipe do Núcleo Curitiba, a produção do boletim de notícias mensal Copa em Discu$$ão, com análise crítica dos preparativos do poder pública para a realização da Copa do Mundo no Brasil.
Veja a seguir a primeira parte da entrevista de Olga Firskowski para a Revista Ciência Hoje.
Instituto Ciência Hoje (ICH) é uma sociedade civil sem fins lucrativos criada em 2003. Mas sua história começa bem antes, ainda em 1982, com o lançamento da revistaCiência Hoje, vinculada à Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Além da CH, hoje o Instituto é responsável por uma série de publicações de divulgação científica, como a Ciência Hoje das Crianças e os livros da série Ciência Hoje na Escola. O Instituto mantém também um portal de divulgação científica na internet, aCiência Hoje On-line.
ENTREVISTA: O legado dos megaeventos
Olga Firkowski
Quando o assunto é planejamento urbano, qual tem sido a influência dos megaeventos esportivos no Brasil?
Temos visto duas situações peculiares: cidades que já tinham uma série de projetos urbanísticos – que foram acionados a partir da Copa do Mundo devido a novas linhas de financiamento – e cidades que desenvolveram esses projetos a partir do ‘álibi’ de oportunidade que foi esse evento. São Paulo e Curitiba, por exemplo, já tinham diversas ações planejadas no que se refere a transporte e melhoras urbanas gerais. Já Recife, Natal ou Cuiabá, por exemplo, estão trabalhando em obras especialmente para o evento. São duas lógicas distintas.
As obras se destinam mais ao conforto dos eventos esportivos ou mais ao bem-estar da população que habita as cidades em questão?
Depende. Os projetos que já existiam não têm só a copa como horizonte. O problema é que boa parte desses projetos foram deixados em segundo plano em detrimento daqueles específicos para atender as demandas dos megaeventos. Vejamos o caso de Curitiba: as obras de infraestrutura de que a cidade precisa foram retiradas da perspectiva do médio prazo. Priorizaram-se as reformas que contemplam o caminho entre o aeroporto, a rodoviária e o estádio. Dinâmicas semelhantes são observadas em diversas outras cidades brasileiras que receberão a Copa do Mundo.
Que benefícios podemos esperar para as cidades brasileiras a partir do legado dos megaeventos? Dá para ser otimista?
Sim e não. Tudo depende do preço que a sociedade está disposta a pagar e como ela entende esse legado. Obras de mobilidade são importantes e necessárias. Mas é constrangedor pensar que precisamos de um álibi – como a copa do mundo – para que essas intervenções tenham a mínima possibilidade de sair do papel. Reforma de aeroportos, estruturas viárias, metrôs… Isso tudo não é somente para a copa. É para o bom funcionamento das cidades. E que sociedade é essa que precisa de uma desculpa do tamanho da copa para tirar isso do plano das ideias e fazer o que deve ser feito?
Como a senhora entende o caso de Recife, por exemplo? A cidade está dedicando generosos recursos à chamada ‘cidade da copa’, construída especialmente em função da copa do mundo.
A dúvida: será um legado positivo ou negativo? Será mais reprodução de um estilo urbano baseado em condomínios fechados ao lado de um grande centro de lazer? Um modelo de autossegregação de camadas sociais distintas? Como será a integração dessa ‘cidade da copa’ com o município? Só saberemos no futuro. A princípio, não me parece um projeto dedicado à melhora da qualidade de vida das pessoas que vivem na região. Importante lembrar: a copa é só um exemplo. Os megaeventos todos irão passar, mas o modelo dessa relação público-privada que eles têm potencializado permanecerá.
Acesse a entrevista completa da professora Olga Firkowski no site da Revista Ciência Hoje.