O Projeto Habitação Popular Quilombo da Gamboa, iniciativa que promove o modelo autogestionário de produção de moradia, está com uma campanha de financiamento coletivo para viabilizar a continuidade de suas atividades que contemplam 116 famílias de baixa renda, na zona portuária do Rio de Janeiro.
O projeto nasceu a partir de uma árdua luta dos movimentos sociais, Central de Movimentos Populares e União de Moradia Popular, porém, por conta da atual conjuntura, encontra-se paralisado. A iniciativa desenvolve diversas atividades nos seis terrenos que foram cedidos pela União, mas encontra dificuldades para prosseguir e continuar dando oportunidade as 116 famílias que participam do projeto – cerca de 70% dos titulares dos núcleos familiares são mulheres e 44% possuem mais de 50 anos.
O Observatório das Metrópoles acompanha e apoia essa e outras iniciativas autogestionárias no Rio de Janeiro, promovendo oficinas e cursos de formação que fortalecem o ativismo desses movimentos. As pesquisas desenvolvidas pela rede também evidenciam que, a despeito da legitimidade constitucional da moradia como direito, a mercantilização da cidade impõe diversos arranjos, instrumentos e processos que acentuam as desigualdades socioespaciais do espaço urbano.
No caso do Porto Maravilha e seu projeto de “revitalização” da área portuária do Rio de Janeiro, Mariana Wernerck, pesquisadora do Observatório das Metrópoles, destaca os números que traduzem a supremacia do mercado na construção da cidade:
“O Quilombo da Gamboa é um projeto exemplar não apenas por ser premiado e reconhecido como uma iniciativa popular de ocupação do centro do Rio e de promoção do direito à cidade, mas também por sua excepcionalidade. Como um dos únicos terrenos de toda a área portuária do Rio de Janeiro a ter destinação para a habitação popular, o Quilombo expressa como as políticas de destinação de imóveis públicos para fins sociais e para o cumprimento da função social da propriedade, que têm respaldo na Constituição, enfrentam entraves sociais, políticos, jurídicos e administrativos dos mais diversos. O mesmo não aconteceu com os imóveis da União transferidos ao mercado: em plena operação do Porto Maravilha, cerca de 21 terrenos públicos foram mercantilizados para criar condições de financiamento à chamada revitalização. Estamos falando de mais de 400 mil m² de terra privatizada, cerca de 56 Maracanãs, que deram lastro à emissão de CEPACs e fizeram da área portuária uma plataforma para extração de sobrelucros por agentes financeiros e imobiliários – a despeito de sua história como território negro e popular de resistência. Por isso, defender o Quilombo da Gamboa é defender a luta por uma cidade mais justa“.
Nesse sentido, Tarcyla Fidalgo, pesquisadora do Observatório das Metrópoles e assessora jurídica do Quilombo da Gamboa, defende que o apoio ao projeto representa também o apoio ao direito à cidade:
“O projeto de habitação popular Quilombo da Gamboa é um marco de resistência e luta por moradia no centro do Rio de Janeiro. A união e comprometimento dos participantes é um sopro de esperança que merece e precisa ser fortalecido. A continuidade do projeto, apesar das incontáveis dificuldades, demonstra a força daqueles que demandam seu direito fundamental à moradia adequada em um cenário político, social e econômico tão hostil como o presente. Ajudar o projeto vai muito além dos seus mais de 100 participantes. Trata-se de manter viva a resistência e a luta no coração de nossa cidade. Vida longa ao Quilombo da Gamboa que já teve muitas vitórias e, com nossa ajuda, pode ter muitas mais!“.
Para Marcelo Edmundo, dirigente da Central de Movimentos Populares (CMP), o Quilombo da Gamboa é um projeto de grande relevância no debate da questão habitacional na cidade, principalmente por estar situado na área do Porto Maravilha e ter os movimentos sociais como organizadores (a CMP e a União por Moradia Popular).
“O Projeto de Moradia Popular Quilombo da Gamboa, surge a partir de uma grande luta dos Movimentos Populares por todo país, para que os imóveis da União tivessem o destino prioritário previsto em lei, ou seja: Habitação de Interesse Social. Apesar da luta, poucos terrenos foram efetivamente destinados para tal finalidade, entre eles os da Rua da Gamboa, onde, desde 2009, desenvolvemos um projeto para beneficiar 116 famílias pobres e fazer valer o Direito à Moradia. Para isso, apresentamos um projeto e fomos contemplado pelo FNHIS (Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social) e posteriormente pelo MCMV-Entidades, sendo contratado pela Caixa em 2015. São mais de 10 anos de lutas e sonhos, com reuniões mensais para organização, divisão de tarefas, trabalhos e atividades enquanto aguardamos o início do projeto. No entanto, se as coisas já eram bem complicadas devido à burocracia, com o novo cenário politico no país pioraram bastante. É para dar continuidade as nossas atividades e ações e manter mobilizado o nosso povo que fazemos esta campanha de financiamento, certos de que só a luta e a solidariedade mudam a vida!“.
Por fim, Gustavo M. Poeys, arquiteto e urbanista que presta assessoria técnica para o Quilombo da Gamboa, destaca que o projeto visa atender a demanda por moradia, mas também espaços (como cozinha, vestiário e galpão) que oportunizem dinâmicas colaborativas:
“O projeto de habitações provisórias do Quilombo da Gamboa é constituído por um conceito que articula unidades individuais de moradia, a possibilidade de trabalho e geração de renda, além do fortalecimento de uma identidade local que se desenvolva em ações culturais, debates sobre a contemporaneidade e a possibilidade de capacitação profissional. Nesse sentido, a modificação espacial se apresenta com um duplo caráter: em um primeiro momento, responde à necessidade de um local previamente determinado para habitação social e, em um segundo momento, a ocupação estrutura-se numa abordagem conceitual cuja materialização em um novo espaço que fortaleça a união dos movimentos sociais envolvidos na luta por moradia, busca transformar o habitat numa construção coletiva que incorpora valores sociais, culturais e políticos e desenvolve um modo de vida que mantenha articulado decisões individuais em função de ações coletivas e cooperativistas“.
Para contribuir, acesse o link da campanha: CLIQUE AQUI.
Quilombo da Gamboa Resiste!
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