O INCT Observatório das Metrópoles em parceria com a Fundação Bento Rubião e a ONG Ação Urbana realizaram, entre junho e agosto deste ano, o Programa de Formação: Políticas Públicas e o Direito à Moradia. O objetivo do curso foi capacitar agentes sociais, lideranças comunitárias e conselheiros municipais para participar do Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS), que será implementado, pela primeira vez, no município do Rio de Janeiro.
O Plano de Habitação de Interesse Social é requisito básico para que os municípios se integrem ao Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social que tem como escopo principal implementar políticas e programas que promovam o acesso à moradia digna para a população de baixa renda, que compõe a quase totalidade do déficit habitacional do País. Instituído pela Lei Federal nº 11.124, de 16 de junho de 2005, o Sistema é composto por um Fundo Nacional e um Conselho Gestor (Conselho Nacional das Cidades); e para que o município faça parte desse sistema, ele precisa formar o seu Fundo, Conselho e Plano Local. O Rio de Janeiro aderiu ao sistema por meio da Secretaria Municipal de Habitação e, agora, está na etapa de formulação do plano.
Com o tema Política Habitacional e o Direito à Moradia Digna, o curso coordenado pelo Observatório das Metrópoles, a ONG Ação Urbana e a Fundação Bento Rubião buscou fornecer, desse modo, instrumental teórico para que os agentes sociais pudessem compreender os fatores geradores das desigualdades de acesso à moradia, com destaque para os programas habitacionais e a legislação urbana vigentes. Além disso, o conteúdo programático se voltou para a formulação, por parte dos movimentos populares, de políticas e programas habitacionais que respondam às necessidades e desejos dos segmentos sociais de baixa renda e que possam ser discutidos no Fórum do PLHIS do Rio.
Segundo Regina Fátima Ferreira, pesquisadora do Observatório das Metrópoles e uma das coordenadoras do Programa de Políticas Públicas, a proposta era formar novas lideranças e qualificar os agentes sociais para participar do debate por uma habitação mais inclusiva. “O curso, além de ser um espaço de formação, foi um espaço de articulação e fortalecimento da sociedade civil do Rio de Janeiro. Durante os encontros, os agentes sociais e lideranças comunitárias puderam trocar experiências, conhecer as várias realidades urbanas do município em relação à habitação”, afirma.
Diagnóstico das diversas realidades urbanas
Morador da Favela da Rocinha há 50 anos, Ronaldo Batista construiu uma história de mobilização pelo direito à moradia, sobretudo nas reuniões da Pastoral das Favelas e do Fórum Cultural da Rocinha/Rocinha Sem Fronteiras. Por meio dessas organizações, ele tem lutado pela legalização territorial das favelas e a consolidação de aparelhos urbanos para uma vida digna – como rede de esgoto, abastecimento de água e benfeitorias. “Com o curso de Políticas Públicas, comecei a vislumbrar a possibilidade de participar da elaboração do PLHIS, de contribuir e apresentar as necessidades da Rocinha. Acho que o conteúdo nos ajudou a entender os nossos direitos e de poder cobrar dos governantes a implementação de programas para a melhoria das favelas”, defende.
Ronaldo Batista foi um dos 80 participantes inscritos no programa, vinculados a diversas entidades e movimentos pelo direito à moradia, tais como Movimento Nacional de Luta pela Moradia, Pastoral das Favelas, Central dos Movimentos Populares, Ocupação Quilombo das Guerreiras, Associação de Moradores de Vila Autódromo, Comunidade da Pedreira, União dos Movimentos de Moradia, Central Distrital da Saúde da AP5, entre outros.
Já Sérgio Antônio da Silva, representante do Movimento Nacional de Luta pela Moradia, conta que é morador da Área de Planejamento 1 (AP1) – que engloba o Centro, os bairros de São Cristóvão, Zona Portuária, entre outros – e vê falta de clareza por parte do governo em relação à região, sobretudo por conta das obras para a Copa do Mundo e Olimpíadas. “Quis fazer o curso para participar do Fórum e da elaboração do PLHIS, e também atualizar as informações sobre a política de habitação que existe no Brasil”, afirma.
Dentro do Programa de Políticas Públicas, ele fez parte de um GT para a elaboração de um diagnóstico sobre a AP1, com o levantamento dos imóveis abandonados. “Na pesquisa que fizemos foi possível conhecer os principais imóveis que não estão sendo usados na área, ou seja, espaços que podem ser aproveitados no Plano de Habitação de Interesse Social, já que são imóveis que não estão atendendo a demanda de uso”, explica.
Outra questão debatida no curso tratou dos processos de remoção que têm sido realizados no Rio de Janeiro para as obras dos megaeventos. A moradora de Vila Autódromo, Jane Nascimento de Oliveira, contou como tem vivido a população da região, a falta de clareza e de respeito para com os moradores que vivem ali. “Eu acho que é o sonho de todo brasileiro, não só do morador de Vila Autódromo, que as leis sejam cumpridas, que elas funcionem. Porque, muitas vezes, é um desafio pra gente participar de todo esse processo, se reunir e mobilizar para ver o governo não respeitando os direitos, não agindo em benefício do povo”, declara.
Megaeventos: Comunidades cariocas sofrem com o processo de espoliação urbana
Para a moradora de Vila Autódromo falar em direito à moradia é mais do que dar uma casa para a pessoa. “Pra mim moradia digna é aquela que satisfaz o ego do morador. Com uma boa infraestrutura local e com políticas públicas e sociais que auxiliem a pessoa a viver na cidade, a trabalhar e a conquistar seu espaço social – com emprego, escola etc. Além disso, é contar com hospitais próximos, bom sistema de transporte, saneamento básico”.
Participação popular no Fórum do PLHIS
O município do Rio de Janeiro já aderiu ao Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social, realizou a montagem do Conselho gestor e do Fundo, e agora está formulando o Plano de ação. A Fundação Bento Rubião (FBR) é responsável pela consultoria técnica, articulação e acompanhamento do Fórum.
PLHIS se caracteriza como o momento de dimensionar/mensurar as necessidades habitacionais da cidade, não só em termos de necessidade de moradia nova, mas também de qualidade. Isto é, mensurar o tamanho do problema e elaborar um plano de ação de longo prazo (em média 15 anos) para resolver o problema local de habitação.
Segundo Rosane Biasotto, coordenadora técnica dos Planos de Habitação de Interesse Social da FBR, o PLHIS é composto de três etapas: 1ª) Construção da metodologia de processo, com as especificações dos termos de referência e as condições para uma ação participativa; 2ª) Diagnóstico do setor habitacional; 3ª) Formulação do Plano de Ação. “A metodologia já está pronta e agora estamos na etapa do diagnóstico, de responsabilidade da Prefeitura. A Fundação Bento Rubião dará apoio técnico nos temas relativos aos vazios habitacionais; além disso, ficamos responsáveis pela elaboração de cinco cenários – econômico, institucional, urbano-ambiental, recursos financeiros e cadeia produtiva”, explica.
Na segunda etapa também estão previstas a realização de Oficinas Regionais e Seminários Temáticos, que irão discutir temas como a regularização fundiária e urbanística das favelas e loteamentos; a recuperação de conjuntos habitacionais, locação social e produção de novas unidades. “O Fórum começou a ser formado com o Programa de Formação em Políticas Públicas, já que este foi também um espaço de articulação, e depois será consolidado nas Oficinas Regionais. A nossa expectativa era criar esse caldo crítico para formação do Fórum, sabemos que essa é uma ação que demanda muita energia e fundamental para a elaboração do PLHIS”, defende a coordenadora.
Dentre os desafios, o principal, segundo Biasotto, refere-se à implementação de longo prazo. “Pelo histórico do Rio de Janeiro e outras cidades, vemos que é muito difícil executar um plano durante 10 a 15 anos, acompanhar as ações, reformular diretrizes e avaliar os resultados”, afirma.
Experiências de moradia autogestionária
Para fortalecer a formação dos grupos organizados que pretendem participar do Fórum do PLHIS, o Observatório das Metrópoles irá oferecer oficinas com a temática da moradia autogestionária, com foco nos programas de habitação de interesse social como o programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV).
Última modificação em 08-09-2011 03:29:14