Promovido em formato presencial entre os meses de novembro e dezembro de 2021, o curso “O direito à cidade e o sistema de justiça: instrumentos e estratégias de incidência” teve por objetivo traçar um panorama do sistema de justiça brasileiro para pessoas que não tem formação em Direito e refletir sobre os seus potenciais e limitações, de modo que seu acionamento possa ser pensado como uma estratégia no âmbito das lutas urbanas. A capacitação contou com 77 inscritos e carga horária total de 40 horas. Esta semana, os organizadores disponibilizaram a gravação de todas as aulas, e os(as) interessados(as) podem assisti-las no canal do Observatório das Metrópoles no Youtube.
Para a pesquisadora do Observatório Núcleo Rio de Janeiro e coordenadora do projeto Termo Territorial Coletivo na ComCat, Tarcyla Fidalgo, o curso, em sua primeira edição, se mostrou muito bem-sucedido no sentido de ampliar a compreensão dos participantes sobre o sistema de justiça e sua atuação nos conflitos fundiários:
“O conhecimento sobre a estruturação do sistema de justiça e os instrumentos jurídicos à disposição de movimentos e coletivos fortalece a luta por direitos desses agentes e permite o desenvolvimento de reflexões mais profundas sobre os processos que os atravessam da dimensão conflitual de sua atuação”, pontuou.
A capacitação teve como público-alvo lideranças de base dos movimentos populares e foi elaborada em torno dos temas do direito à cidade e do sistema de justiça, com ênfase nas políticas urbanas. Segundo os organizadores, o conteúdo do curso deve permitir a possibilidade de avançar na democratização do acesso ao sistema de justiça e do espaço urbano e, ao fim, na construção de um outro tipo de cidade e sociedade, mais justa e solidária com todos e todas.
Um dos materiais utilizados no curso foi o Caderno de Formação: O Direito à Cidade, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e as Políticas Públicas, organizado por Orlando Santos Junior, Valéria Pinheiro e Patrícia Ramos Novaes, pesquisadores do Observatório das Metrópoles. A publicação está disponível no site do Observatório.
Direito à cidade é um desafio para a afirmação da própria dignidade humana
Os conflitos urbanos que vem ocorrendo nas últimas décadas no Brasil têm sido agravados pelos inúmeros problemas econômicos, sociais e ambientais. Problemas estes já conhecidos pela população mais vulnerável, como a desigualdade social, a favelização das cidades, a violência, a especulação imobiliária, a carência de serviços públicos, a poluição e a desigualdade socioespacial. Nesse sentido, as cidades não podem ser justas e atender às necessidades de seus moradores, enquanto milhares de famílias não têm acesso à moradia digna, são despejadas de suas casas ou são invisibilizadas pelo poder público. Assim, o direito à cidade é um desafio para a afirmação da própria dignidade humana.
Para os organizadores do curso, esse direito só será conquistado quando todos e todas tiverem efetivamente acesso à terra, aos meios de subsistência, à moradia digna, ao saneamento ambiental, à saúde, educação, transporte público de qualidade, alimentação, trabalho, lazer e informação. Diante do cenário dos conflitos e disputas estabelecidos no contexto urbano, o sistema de justiça ganha protagonismo ao ser frequentemente acionado para atuar e, muitas vezes, responsável por decidir tais conflitos. Logo, trazer aos participantes um instrumental sobre o sistema de justiça – aumentando o conhecimento sobre sua estrutura, atores e funcionamento – tem um amplo potencial de apoio à luta pelo direito à cidade, potencializando os caminhos que podem ser percorridos através da participação popular e do controle social.
O curso “O direito à cidade e o sistema de justiça: instrumentos e estratégias de incidência” foi uma promoção da Habitat para a Humanidade Brasil, Observatório das Metrópoles, Fórum Nacional de Reforma Urbana, Central de Movimentos Populares (CMP), Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Rede Jubileu Sul Brasil, Centro de Estudos Jurídicos (Cejur), Fundação Escola Superior da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (Fesudeperj), CDES Direitos Humanos, Semana Social Brasileira (SSB), Sinergia Popular, com apoio da União Europeia, Misereor – Ihr Hilfswerk e Institut für Auslandsbeziehungen (ifa).
Confira os módulos e os conteúdos de cada aula:
Módulo 1: O sistema de justiça
Encontro 1 | Apresentação do curso (dinâmica, avaliação, escuta de expectativas).
- Dinâmica: Neste encontro a turma foi dividida em grupos para trabalhar ao longo do curso com casos emblemáticos de conflito e discutir formas de acionar o sistema de justiça brasileiro e o sistema internacional de justiça na busca por soluções.
- Responsável: Equipe pedagógica
- Ementa: A organização, as competências e a territorialização das estruturas vinculadas ao sistema de justiça brasileiro.
- Responsáveis: Maria Carmem de Sá (Defensoria) e Sandra Quintela (Instituto Jubileu Sul)
- Ementa: O Sistema Internacional de Justiça, o papel das cortes internacionais e do Tribunal Peal Internacional. O que pode ser levado às cortes internacionais. Qual é o procedimento para denúncias/notificações?
- Responsável: Daniel Lozoya (Defensoria) e Eduardo Baker (Justiça Global)
Encontro 4 | As relações entre o sistema de justiça e a população.
- Ementa: Direitos e deveres relacionados a procedimentos e processos judiciais. Canais institucionais de interação entre o sistema de justiça e a população. Casos emergenciais, a quem e como recorrer? O sistema de justiça e os conflitos sociais.
- Responsável: Guilherme Pimentel (Ouvidor Externo da Defensoria Pública)
Encontro 5 | Instrumentos jurídicos internos de acionamento do sistema de justiça nacional.
- Ementa: Instrumentos jurídicos à disposição da sociedade para o acionamento do sistema de justiça nacional nas estratégias de exigibilidade de direitos.
- Responsável: Tarcyla Fidalgo (Observatório das Metrópoles)
Módulo 2: Os conflitos urbanos e o sistema de justiça
Encontro 6 | Criminalização dos movimentos sociais.
- Ementa: A conjuntura de criminalização dos movimentos sociais e de suas lideranças. Estratégias de defesa e de afirmação do direito à organização e ativismo político.
- Responsável: Fernanda Vieira (FND), Marcelo Edmundo (CMP) e Patricia Oliveira (Rede Contra a Violência)
Encontro 7 | A criminalização do trabalho: os camelôs e o sistema de justiça. (Aula realizada em campo)
- Ementa: A conjuntura de criminalização do trabalho dos camelôs e de suas lideranças. Estratégias de defesa e de afirmação do direito ao trabalho nas ruas.
- Responsáveis: Maria Júlia (Defensoria) e Maria dos Camelôs (Movimento Unido dos Camelôs – MUCA)
Encontro 8| Conflitos fundiários e o direito à moradia.
- Ementa: Os conflitos fundiários coletivos, a função social de propriedade e o direito à moradia. Instrumentos de exigibilidade do direito à moradia.
- Responsáveis: Ricardo Mattos (Defensoria Pública) e Mariana Trotta (Faculdade Nacional de Direito)
Módulo 3: A instrumentalização do sistema de justiça para as lutas urbanas
Encontro 9 | Formas não judicializantes de acesso à direitos.
- Ementa: Os principais instrumentos e processos não judicializantes de exigibilidade de direitos.
- Responsável: Júlio Araújo (MPF)
Encontro 10 | Instrumentos e possibilidades de acionamento do sistema de justiça internacional.
- Ementa: Principais instrumentos, e o contexto de sua aplicação, no acionamento do sistema de justiça internacional nas estratégias de exigibilidade de direitos.
- Responsável: Lucas Arnaud (CEJIL)
Encontro 11 | Violação de direitos e (não) participação popular: o PL 141.
- Ementa: A participação popular como um direito, a ausência de participação na política urbana como uma violação de direitos, os principais canais e instrumentos de participação popular na política urbana.
- Responsável: Lucas Faulhaber (CAU)
Encontro 12 | Encerramento
- Dinâmica: Apresentação de trabalhos pelos grupos e finalização do curso (os alunos apresentaram uma reflexão em grupo em torno de casos de conflitos fundiários urbanos).
- Responsável: Equipe Pedagógica
Confira o conteúdo das aulas em nosso canal no Youtube: