O Porto Maravilha, como ficou conhecido, é a maior parceria público-privada da história do Brasil, com custo de mais de R$ 8 bilhões. Nesta reportagem do Jornal do Brasil, a pesquisadora Mariana Werneck, integrante do INCT Observatório das Metrópoles, mostra os mecanismos de funcionamento do projeto, especialmente aquele vinculado ao processo de financeirização da política urbana, já que o projeto do Porto Maravilha envolveu, desde o início, ativos financeiros. Segundo Werneck, o que se viu foi um projeto de interesse público sofrendo pressões do mercado imobiliário e dos investidores; além, é claro, de processos de gentrificação, remoções forçadas e promessas de contrapartidas sociais que não saíram do papel.
A pesquisadora Mariana Werneck vem desenvolvendo pesquisas e monitorando o processo de produção social do Porto Maravilha. Em 2016 ela defendeu a dissertação “Porto Maravilha: agentes, coalizões de poder e neoliberalização”, que mostra como o projeto de revitalização da zona portuária do Rio de Janeiro se insere em um processo global de mercantilização da cidade, marcado, no caso do Porto Maravilha, por um arranjo inédito que combina parcerias público-privadas e instrumentos do mercado de capitais. Um processo que determina um novo padrão de relação entre o poder público e o setor privado, inaugurando, por um lado, um novo modelo de gestão da cidade, e, por outro, acirrando as desigualdades socioespaciais do Rio.
A operação urbana consorciada do Porto Maravilha foi uma das obras mais caras das últimas décadas, e sempre foi alvo de denúncias de esquemas de propina, mau uso do dinheiro público, falta de transparência, remoções forçadas e descumprimento da legislação ambiental. No atual contexto em que o ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e parte da sua equipe estão presos por desvio de recursos; e o estado do Rio está quebrado financeiramente, a Rede Observatório das Metrópoles entende ser oportuno investigar e avaliar as condições de todas as obras públicas relacionadas às obras preparativas para a Copa do Mundo e Jogos Olímpicos realizados na cidade.
Em razão disso, divulgamos a proposta de CPI do Porto Maravilha.
PORTO MARAVILHA: O FRACASSO DE UM PROJETO BILIONÁRIO QUE EXCLUIU OS MENOS FAVORECIDOS
JORNAL DO BRASIL
“O nosso legado olímpico é de exceção”, criticou Mariana Werneck, mestre em planejamento urbano pela IPPUR/UFRJ. “Sofremos grandes mudanças que permitiram essa relação entre o público e o privado, e o que ficou para trás é o interesse público”, completou. A pesquisadora do Observatório das Metrópoles se refere as obras do Porto Maravilha, uma das grandes dívidas da gestão do ex-prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB). Em uma análise da conjuntura do município a partir do estudo “O Rio em perspectiva: um diagnóstico de escolhas públicas”, um levantamento da FGV/DAPP revela que os preços dos papéis que capitalizam a obra mais do que triplicaram desde 2011, e os títulos passaram a não ter compradores interessados, o que representa um problema fiscal para a cidade.
Mas o enredo realmente complexo está em como se deu o processo de obras no Porto, e as consequências catastróficas dele, principalmente, para a população local.
“Quando se fez esse desenho do Porto, foi utilizado um instrumento que já era polêmico para os urbanistas, e que já vinha sendo muito usado em São Paulo e outras cidades”, comentou Mariana. “A gentrificação possivelmente ocorreria se o processo tivesse dado certo, ou seja, seria incorporado ali o modelo elitista, e aquela população tradicional ia acabar sendo expulsa indiretamente por um aumento no preço do terreno”, explicou o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, Cláudio Ribeiro.
O fenômeno chamado gentrificação afeta uma região pela alteração das dinâmicas da composição do local, tal como novos pontos comerciais ou construção de novos edifícios, atingindo, principalmente, a população de baixa renda local, que não consegue se manter devido à valorização do terreno.
O ex-prefeito do Rio Eduardo Paes nunca negou o fenômeno. Em entrevista para a BBC News no dia 15 de agosto de 2015, Paes reafirmava sua posição rebatendo críticas de urbanistas: “O fenômeno mundial da gentrificação ocorre em grandes cidades, do qual Londres talvez seja o caso mais explícito. É algo que acontece em Nova York, Berlim, e também no Rio, que é um processo de sobrevalorização conforme as cidades se qualificam. Na Zona Sul do Rio, por exemplo, não há mais onde construir, então é óbvio que o que já existe vai ficar mais caro. E aí você precisa requalificar outras áreas da cidade, como a Zona Norte”.
Claudio explica que a partir desse processo, a cidade do Rio fica mais segregada. “Uma cidade que tem o preço solo mais caro, é mais cara para todo mundo. Só é vantagem para os donos dos imóveis”, rebateu, acrescentando: “Em vez de trazer mais gente para onde tem urbanização, o que o ex-prefeito fez foi afastá-las. E aí a cidade, agora, está expandida, e mais cara de se manter. Temos como herança uma cidade muito pior do que antes”.
Mas Claudio ressalta que o processo inicialmente previsto não deu certo, e que agora a capital carioca tem que arcar com um legado de elefantes brancos, dívidas exorbitantes e uma crise econômica que parece não ter fim.
“Podemos pensar em uma espécie de gentrificação acelerada e brutal, porque o que nós temos hoje é um vácuo habitacional em uma das poucas áreas centrais do Rio”, completou.
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