Políticas habitacionais e acesso à cidade em Santo André/SP
No contexto da reabertura democrática do país, o município de Santo André (SP) se destaca por sua postura diante do enfrentamento de seus problemas sociais através da estruturação de seu quadro legal e elaboração e aplicação de programas sociais, tidos como referência nacional e internacional. O artigo de Bárbara Oliveira Marguti realiza uma análise da produção de moradia nas duas últimas décadas nesse município, a fim de avaliar a estrutura socioespacial e determinar em que medida as políticas habitacionais de interesse social conferem à população beneficiada o acesso à cidade.
O artigo “Políticas habitacionais e acesso à cidade em Santo André/SP” é um dos destaques da edição nº 12 da Revista eletrônica e-metropolis – publicação trimestral que tem como objetivo principal suscitar o debate e incentivar a divulgação de trabalhos relacionados à dinâmica da vida urbana contemporânea e áreas afins. A Revista e-metropolis é editada por alunos de pós-graduação de programas vinculados ao INCT Observatório das Metrópoles e conta com a colaboração de pesquisadores, estudiosos e interessados de diversas áreas que contribuam com a discussão sobre o espaço urbano de forma cada vez mais vasta e inclusiva.
POLÍTICAS HABITACIONAIS EM SANTO ANDRÉ
Por Bárbara Oliveira Marguti
Este estudo apresenta uma reflexão acerca do papel das políticas habitacionais na configuração socio-espacial do município de Santo André, a partir da avaliação das consequências locacionais experimentadas pela população atendida pelas ações municipais, desde a década de 1990 até a construção do primeiro conjunto habitacional pelo Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), em 2011. Trata-se de um momento histórico, de elevado aporte de recursos para habitação, no qual a quantidade de unidades a serem produzidas é o objetivo primeiro, em detrimento da articulação com a política urbana e com a garantia do acesso à moradia bem localizada. No contexto da crise econômica mundial e da elaboração do Plano Nacional de Habitação, o lançamento do PMCMV, desconsiderando os avanços conceituais no campo da legislação urbanística e de projetos arquitetônicos, gera o receio do retorno das práticas executadas pelo Banco Nacional de Habitação (BNH), iniciadas há quatro décadas e marcadas pela má localização dos conjuntos habitacionais e sua bai¬xa qualidade arquitetônica.
Aqui a localização da moradia e dos equipamentos e serviços urbanos tem destaque central, uma vez que sua distribuição no espaço urbano é capaz de gerar efeitos distributivos sobre a renda real de diferentes grupos sociais. A noção de renda real é definida genericamente por Harvey (1980, p.56) como “o domínio sobre os recursos” e está baseada no conceito apresentado por Titmuss (1962 apud Harvey, 1980), que coloca:
Nenhum conceito de renda pode ser realmente justo se restringe a definição ampla que abrange todas as receitas que aumentam o poder do indivíduo sobre o uso dos recursos escassos de uma sociedade; em outras palavras, seu acréscimo líquido de poder econômico entre dois momentos no tempo… Por essa razão, a renda é a soma algébrica (1) do valor de mercado dos direitos exercidos no consumo e (2) da troca no valor do suprimento de direitos de propriedade entre o começo e o fim do período em questão”(p.41).
O acesso a oportunidades de emprego, recursos e serviços de bem-estar pode ser obtido apenas através de um preço, correspondente ao custo de superar distâncias e utilizar o tempo (Harvey, 1980). Por essa razão, a comparação realizada neste trabalho sobre o acesso aos serviços de transporte e de saúde, no local de origem e no local atual de moradia da população, permite mensurar os ganhos ou perdas experimentados pelas famílias beneficiárias dos programas habitacionais do município. Tomando como premissa que o domínio sobre os recursos é função da acessibilidade e proximidade locacionais, Harvey (1980) nos auxilia demonstrando a relação entre a distribuição da renda real e o processo político, ressalvando que “[…] a comunidade mais poderosa (em termos financeiros, educacionais ou de influência) está apta a controlar as decisões locacionais em seu próprio proveito” (p.61).
Dessa forma, uma distribuição justa dos recursos no tecido urbano implicaria, em primeiro lugar, na necessidade de redistribuição do poder, contrapondo-se à lógica hoje existente na cidade na qual os incorporadores imobiliários se apropriam das porções do território com maiores vantagens locacionais, atu-ando através da expansão das fronteiras urbanas, da criação de novos espaços em áreas antes não-urbanas e da revitalização de espaços, através da destruição/construção de edificações (Ribeiro, 1997). Considerando o pressuposto de que a utilidade da moradia não se resume às suas características internas e que “seu valor de uso é também determinado pela sua articulação com o sistema espacial de objetos imo-biliários que compõem o valor de uso complexo representado pelo espaço urbano” (Ribeiro, 1997, p. 51), é possível compreender o surgimento dos lucros extraordinários obtidos pelo incorporador – agente que coordena o processo produtivo e a comercialização – a partir do acesso diferenciado que a localização dos terrenos propicia ao uso da cidade.
Para além do direito à moradia digna, conquista¬da pelas famílias através dos programas de urbanização de favelas e suas consequentes realocações, este trabalho trata do acesso à cidade, tomando como elementos de investigação o serviço de transporte e o serviço de equipamentos de saúde (atenção básica). Para as investigações mencionadas foram selecionados três conjuntos habitacionais, promovidos pelo poder público municipal, representativos de cada década, a saber: conjunto habitacional Prestes Maia (década 1990), conjunto habitacional Alzira Franco (década 2000) e conjunto habitacional Guaratinguetá, a ser construído no âmbito do PMCMV no decorrer da presente década.
Os assentamentos precários investigados foram aqueles de origem das famílias beneficiadas por novas unidades habitacionais. Para as análises do acesso à cidade a partir das condições de acessibilidade ao serviço de atenção básica à saúde, foram selecionadas as Unidades Básicas de Saúde (UBS) localizadas próximas aos conjuntos habitacionais e assentamentos precários em estudo, sobretudo aquelas que contam com equipes do Programa Saúde da Família (PSF) e Programas de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). No que diz respeito às análises referentes aos serviços de transporte, foram selecionadas as linhas de ônibus municipais utilizadas pelos moradores em seus assentamentos de origem e ,atualmente, em seu novo local de moradia. Com base nas informações sobre acessibilidade, disponibilidade do serviço e aceitação, os indicadores selecionados foram comparados para as duas localidades, o que permitiu mensurar melhorias ou pioras no acesso e na qualidade do serviço de transporte prestado a essa população.
Para ver o artigo completo ““Políticas habitacionais e acesso à cidade em Santo André/SP”, acesse a Revista eletrônica e-metropolis edição nº 12 aqui.
Última modificação em 22-05-2013