Depois de uma longa espera encontra-se aberta a Consulta Pública para o Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB). O Plano vai dar materialidade à Lei n. 11.445/2007 e definir os rumos da Política Nacional de Saneamento, estabelecendo objetivos e metas nacionais e regionais para os próximos 20 anos. O Brasil ainda precisa avançar muito para oferecer à totalidade da sua população um serviço sanitário adequado, já que somente cerca de 3 mil municípios brasileiros, o equivalente a 55,2% do total, contam com coleta e tratamento de esgoto. Este é o momento da sociedade civil participar, definindo os caminhos para a universalização do acesso aos serviços de saneamento no País. A consulta pública ficará aberta até o dia 03 de setembro.
Para participar da consulta pública, basta cadastrar-se no site do Ministério das Cidades no link:
http://www4.cidades.gov.br/consulta_plansab/src/sistema/index
PLANSAB: por um processo participativo
A Constituição Federal já estabelecia, em seu artigo 21, ser competência da União “elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social” e “instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos”. No entanto, a área do saneamento básico sempre foi carente de planejamentos estratégicos nacionais de médio e longo prazo, cabendo a estados e municípios o seu planejamento e execução. Por sua vez, a Lei nº 11.445/2007 estabeleceu que a União deve elaborar, sob a coordenação do Ministério das Cidades, o Plano Nacional de Saneamento Básico, instrumento de implementação da Política Federal de Saneamento Básico (Plansab). A mesma Lei estabeleceu ainda que os estados e municípios devem elaborar seus planos – tomando como diretiva o Plano nacional – com horizonte de 20 anos, avaliados anualmente e revisados a cada quatro anos, preferencialmente em períodos coincidentes com os de vigência dos planos plurianuais.
Dessa forma, o Plansab resultou de um processo planejado e coordenado pelo Ministério das Cidades em três etapas: i) a formulação do “Pacto pelo Saneamento Básico: mais saúde, qualidade de vida e cidadania”, que marca o início do processo participativo de elaboração do Plano em 2008; ii) a elaboração, em 2009 e 2010, de extenso estudo denominado “Panorama do Saneamento Básico no Brasil”, que tem como um de seus produtos a versão preliminar do Plansab; e iii) a “Consulta Pública”, que submete a versão preliminar do Plano à sociedade, de modo a promover ampla discussão com vistas à consolidação de sua forma final para posteriores encaminhamentos e execução.
Após a elaboração do documento “Panorama do Saneamento Básico no Brasil”, foram realizados seminários regionais nas cinco regiões brasileiras (Belém/PA, Salvador/BA, Brasília/DF, Rio de Janeiro/RJ e Florianópolis/SC), em abril/maio de 2011. E também audiências públicas no Senado Federal e nos conselhos com interface ao tema do saneamento: Conselho das Cidades (ConCidades), Conselho do Meio Ambiente e Agência Nacional das Águas, e Conselho da Saúde. No âmbito do ConCidades, o GT Saneamento discutiu os aspectos técnicos do Plansab.
De acordo com Vidal Barbosa, integrante da União Nacional dos Movimentos Populares (UNMP) e da União Estadual de Moradia Popular de Goiás (UEPGO), e participante do GT Saneamento, existem pressões muitos grandes para a não implementação do Plansab. “Na época de criação da Lei 11.445, as companhias de saneamento brigaram para que a lei não fosse aprovada. Em seguida, o ConCidades precisou se articular e pressionar para aprovar o decreto de regulamentação. O mesmo processo tem ocorrido para implementar o Plano Nacional de Saneamento Básico. Ter uma plano estruturado de longo prazo, com aporte de investimentos públicos, parece não interessar a iniciativa privada. As informações que circulam afirmam que as empresas da área têm interesse pela privatização das fontes de água, por isso a pressão para não implementar o Plansab”, afirma.
A realidade do saneamento básico no Brasil
O estudo “Panorama do Saneamento Básico no Brasil”, que teve na coordenação geral o professor Léo Heller, do departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG, e como outros a professora Sonaly Rezende também do DESA UFMG, a professora Ana Lúcia Britto, PROURB/INCT Observatório das Metrópoles, os professores Luiz Roberto Moraes e Patrícia Borja da Universidade Federal da Bahia, representou um passo importante para a elaboração do Plansab. O levantamento avaliou a política nacional de saneamento durante o governo Lula (2003-2010), no tocante ao acesso da população aos serviços, à reorganização institucional do setor, com a formulação do marco regulatório; retomada de investimentos, e ampliação das estruturas de gestão participativa e democrática. Os dados revelam que o número de domicílios atendidos por rede de esgoto é de apenas 45,7%. E há ainda fortes contrastes regionais no atendimento sanitário brasileiro. A rede coletora de esgoto da região Norte, por exemplo, permanece a menor do País: apenas 13% dos municípios têm a infraestrutura. Na região Nordeste, o índice é de 45%; e, no Sudeste, de mais de 95%.
“Em relação ao déficit de esgotamento dados da PNSB de 2008, apenas a Região Sudeste registrava uma elevada presença de municípios com rede coletora de esgoto (95,1%). Em todas as demais, menos da metade dos municípios a possuíam, sendo a maior proporção observada na Região Nordeste (45,7%), seguida pelas Regiões Sul (39,7%), Centro-Oeste (28,3%) e Norte (13,4%). Apenas 28,5% dos municípios brasileiros fizeram tratamento de seu esgoto, o que impacta negativamente na qualidade de nossos recursos hídricos. Mesmo na Região Sudeste, onde 95,1% dos municípios possuíam coleta de esgoto, menos da metade desses (48,4%) fazia o tratamento”, explica Ana Lúcia Britto.
A preocupação em relação à água também é atestada por Vicente Andreu Guillo, presidente da Agência Nacional de Águas. Em entrevista para a Revista Carta Capital (edição de 26/03/2012), Guillo afirmou que o cenário da gestão de recursos hídricos no país continua preocupante, já que 55% das cidades brasileiras não fazem os investimentos necessários para evitar problemas sérios de escassez no futuro. Além disso, apenas 30% do esgoto coletado recebem algum tipo de tratamento antes de serem despejados de volta nos rios.
De acordo com Ana Lúcia Britto, a partir do governo Lula ocorreu uma retomada de investimentos na área do saneamento básico, especialmente via Programa de Aceleração do Crescimento (PAC); entretanto a falta de capacidade técnica e gerencial dos municípios tem sido um grande problema. Matéria publicada pelo jornal O Globo (01/04/2012) mostrou que apenas 7%, das 114 obras do PAC voltadas às redes de coleta e sistemas de tratamento de esgotos em municípios com mais de 500 mil habitantes, estavam concluídas em dezembro de 2011. O levantamento aponta ainda que 60% estão paralisadas, atrasadas ou não foram iniciadas. “No caso do PAC, por exemplo, vemos que o governo federal continua liberando recursos para o saneamento básico, mas sem um Plano nacional, sem uma diretiva. Ou seja, o município formula projetos de saneamento para o governo, mas esse projeto não tem uma aderência a uma política nacional de saneamento, porque ela ainda não existe”, afirma Ana Lúcia.
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