O Rio de Janeiro é marcado por um processo histórico de produção desigual do espaço urbano, cujo fenômeno da segregação é a sua expressão mais evidente. No âmbito do processo urbano regional, tendo como recorte espacial privilegiado para análise a região da metrópole fluminense, se assiste o movimento de mudança de um padrão de segregação marcado pelo modelo centro x periferia para um modelo mais complexo de organização social e produção do espaço urbano.
Esse processo tem influenciado, na escala regional, os espaços intraurbanos periféricos. Indaga-se – o que há de novo na periferia, no contexto de reprodução de novas e antigas formas no espaço social metropolitano. É o que mostra Thiago G. Bersot em “Periferias segregadas, segregação das periferias”. Ao analisar a segregação socioespacial intraurbana de São Gonçalo, o autor incita a uma compreensão crítica acerca do espaço urbano periférico atual, rompendo com a ideia de espaço homogêneo em termos de produção e estruturação socioespacial. A antiga “cidade-dormitório” da metrópole vive um fenômeno atual de construção de novas centralidades com base nos novos arranjos produtivos regionais. Nesse sentido, o autor atenta, no contexto de produção capitalista do espaço urbano do município de São Gonçalo, ao processo de verticalização de áreas centrais no contexto de produção de espaços destinados à acumulação de capital, as novas frentes de expansão dos loteamentos horizontais de alta renda para determinadas áreas da franja urbana e aos problemas de ordem socioambiental nas áreas mais precárias.
A dissertação “Periferias segregadas, segregação das periferias: por uma análise das desigualdades intraurbanas no município de São Gonçalo, RJ”, foi defendida por Thiago Giliberti Bersot no âmbito do Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, com a orientação da Dra. Eliane da Silva Bessa e supervisão da Dra. Ana Lúcia Nogueira de Paiva Britto. O trabalho é mais um resultado da Rede de Pesquisa INCT Observatório das Metrópoles.
Segundo Thiago Bersot, o desenvolvimento da dissertação teve como ponto de partida as pesquisas sobre dinâmica espacial nas grandes metrópoles brasileiras, contemplando o debate acerca das mudanças na configuração do espaço metropolitano brasileiro. “Essa transformação consiste no processo de fragmentação socioespacial verificado nos novos padrões de segregação que emergem no espaço urbano das grandes cidades do Brasil, refletindo em novas formas espaciais, assim como alterações nas relações sociais nesse espaço. Para tanto, esse trabalho tem como objetivo investigar a desigualdade e o processo de segregação socioespaciais observados na Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro, tendo como recorte espacial privilegiado de análise o município periférico de São Gonçalo”, afirma o pesquisador.
De acordo com o trabalho, o município de São Gonçalo vem apresentando, ao longo do tempo, mudanças socioespaciais significativas que vêm romper crescentemente com o tradicional status de município periférico e subúrbio industrial, verificado principalmente no processo de segregação socioespacial. “Com base na compreensão de espaço como produto social e da segregação como manifestação clara das disparidades sociais materializadas neste espaço, o estudo representa um convite à compreensão sobre as principais abordagens acerca do espaço geográfico, assim como do entendimento do urbano enquanto locus da produção humana, das relações sociais e das desigualdades na cidade capitalista e principalmente no entendimento sobre as recentes mudanças no processo urbano periférico”, completa.
Recorte espaço-temporal. Do progresso econômico ao estigma de “cidade dormitório”, São Gonçalo apresentou nestes últimos anos a característica de um município metropolitano cujo perfil socioespacial é homogeneamente pobre. A carência histórica de investimentos em infraestrutura básica, o clientelismo político e o mandonismo urbano deflagrado através da articulação entre uma minúscula elite local e o poder público só reforçam o panorama da desigualdade socioespacial na escala da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
No entanto, segundo Thiago Bersot, recentemente o município vem apresentando modificações substanciais em sua estrutura socioespacial, alterando paulatinamente o seu perfil homogêneo. Dois processos de segregação socioespacial distintos emergem no espaço intraurbano: a autosegregação dos estratos médios e altos em condomínios fechados de alto padrão assim como o grande contingente populacional residindo em assentamentos precários extensos na região conferem uma quebra abrupta na organização socioespacial local.
Estrutura da pesquisa. O primeiro capítulo do trabalho dedica-se aos marcos teórico e epistemológico acerca do objeto de pesquisa desta dissertação – a segregação socioespacial. O princípio desta investigação consiste em indagar a respeito do fenômeno como resultante da dinâmica social no espaço geográfico. Logo, a pesquisa teórica se sustenta desde o pioneirismo dos estudos a partir dos teóricos da Escola de Chicago às reflexões oriundas da Escola Crítica e seus principais impactos nos debates brasileiros.
No segundo capítulo, procura-se destacar o papel dos agentes produtores do espaço urbano à luz dos processos de acumulação capitalista do espaço. Para tanto, destaca-se a necessidade de se trabalhar cada agente no conjunto de suas relações dada a complexidade de atuação, assim como se propõe um resgate sobre o desempenho desses agentes na produção no espaço urbano periférico.
No terceiro capítulo, aborda-se os principais aspectos de formação do município de São Gonçalo, a partir de uma análise histórica dos processos sociais, políticos e econômicos no contexto regional. Através desse resgate, atenta-se à necessidade de se trabalhar o processo de evolução urbana do município à luz dos processos urbanos regionais, resgatando a formação do núcleo urbano local, sua evolução e sua caracterização.
No quarto capítulo são examinados os principais indicadores de ordem socioeconômica, por meio de dados tabulares e espaciais, através de ferramentas computacionais com fins de evidenciar os aspectos fundamentais da desigualdade socioespacial que dão forma ao espaço intraurbano local no contexto regional. Para tanto, são trabalhos os principais indicadores de desigualdade locais à luz do processo urbano regional, tais como dinâmica populacional geral, domicílios e infraestrutura, aspectos econômicos e indicadores sociais. Os indicadores são construídos com base nas informações disponibilizadas pelo IBGE, SEPLAG/CEPERJ e UN-HABITAT.
No quinto e último capítulo, Thiago G. Bersot esboça em linhas gerais a compreensão acerca do fenômeno da segregação socioespacial que se opera no município de São Gonçalo. Em busca de um embasamento às análises espaciais, são coletados alguns registros fotográficos e relatos através do contato direto com moradores em algumas áreas selecionadas, percepções acerca da realidade socioespacial com vistas à atuação dos agentes modeladores do espaço urbano e entrevistas com alguns atores locais.
Acesse o trabalho completo “Periferias segregadas, segregação das periferias: por uma análise das desigualdades intraurbanas no município de São Gonçalo, RJ”.