Está sendo debatida uma Medida Provisória que pretende alterar o marco legal que regula os serviços de saneamento no país. A Medida Provisória 868/18 está sendo proposta pelo governo e vem sendo criticada por especialistas pelo risco de desestruturação que ela apresenta ao setor. No dia 15 de abril foi realizada uma audiência pública conjunta de quatro comissões da Câmara dos Deputados, contando com a participação de pesquisadores do Observatório das Metrópoles.
Leia em seguida a reportagem publicada pelo portal de notícias da Câmara dos Deputados:
Por Newton Araujo e Roberto Seabra para Câmara dos Deputados
Publicado em 15/04/2019
Especialistas que participaram de audiência pública conjunta de quatro comissões da Câmara dos Deputados criticaram, nesta segunda-feira (15), a Medida Provisória 868/18, que altera o marco legal do saneamento básico. Segundo eles, se aprovada do jeito que foi enviada pelo governo, a MP vai desestruturar o setor.
De acordo com a MP, os municípios serão obrigados a fazer chamamentos públicos, ou seja, licitações para a prestação dos serviços públicos de água e esgotos, o que favorece a entrada massiva de empresas privadas no setor. Os debatedores acreditam que a iniciativa privada vai optar pelos municípios que dão lucros, deixando de lado os municípios mais pobres, que são a maioria no País. Isso seria o fim do subsídio cruzado, quando os municípios mais ricos ajudam os mais pobres.
Diretor da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental, Sérgio Antonio Gonçalves critica o fato de as mudanças no setor não serem feitas por meio de projeto de lei, o que permitiria uma discussão mais aprofundada do assunto, mas sim por meio de medida provisória, que tem validade imediata.
Segundo ele, a obrigatoriedade de se fazer o chamamento público e a quebra da economia de escala do subsídio cruzado poderão tornar mais difícil a universalização do saneamento. A universalização dos serviços de água e esgotos é um dos argumentos do governo para editar a MP.
Fim da autonomia
Gabriel Alves, diretor da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento, afirmou que um dos principais problemas da MP é a retirada da autonomia dos municípios para decidir como prestar os serviços e, por isso, precisa de ajustes para ser aprovada:
“São os artigos que permitem a substituição dos planos municipais de saneamento por um simples estudo de viabilidade técnica. No nosso entendimento, isso incentiva a cultura do não planejamento. E nós defendemos que a política pública de saneamento tem que ser planejada, tem que ter um envolvimento da população. Inclusive, é no planejamento que o titular do serviço, que no caso é o município, vai ter condições de optar se ele quer conceder para a iniciativa privada, se ele quer delegar para o estado ou se ele quer operar diretamente”, disse.
A professora Ana Lúcia Brito, pesquisadora do Observatório das Metrópoles, duvida que a iniciativa privada vá investir os próprios recursos no saneamento:
“Porque o setor privado, até hoje, vem investindo no setor de saneamento com recursos públicos. A maior parte dos investimentos são recursos onerosos, que vêm do FAT e do FGTS, são empréstimos que são feitos para essas empresas privadas, mas são recursos do trabalhador. Os juros desses fundos são muito baixos e, evidentemente, que interessa a essas empresas privadas ter acesso a esse dinheiro barato, um dinheiro que tem taxa de juros de 5 a 8% ao ano”, observou.
Experiência argentina
A audiência pública foi solicitada por sete deputados, que se manifestaram contrários à medida provisória, como é o caso do deputado Edmilson Rodrigues (Psol-PA):
“A MP 868 transforma a água e os sistemas de saneamento em mercadoria. As experiências são catastróficas no mundo inteiro. Lembremos que a Argentina privatizou suas águas e o resultado foi ter que desprivatizar com a crise econômica e social sem precedentes”, afirmou.
A comissão mista de deputados e senadores que analisa a medida provisória que altera o marco legal do saneamento público fará sua última audiência pública sobre o tema nesta terça-feira (16), antes da apresentação do relatório final e votação. Depois ela deve ser votada pelos Plenários da Câmara e do Senado.