Moradores de favelas e violência policial – representação na RMRJ
As favelas fazem parte da estrutura socioespacial das principais regiões metropolitanas brasileiras. No atual quadro de “violência urbana”, as favelas vêm sendo simbolizadas como lócus privilegiado da violência, e seus moradores como cúmplices de uma minoria envolvida com o tráfico de drogas, o que justificaria ações truculentas por parte do aparato policial contra esta parcela da população. Neste artigo, André Salata verifica o efeito que o fato de o indivíduo morar em favela pode ter sobre suas chances de ser vítima de agressão física policial.
Nas últimas décadas a sociedade brasileira, que até então se imaginava como pacífica (Misse, 2008), vem acompanhando um crescimento significativo das principais taxas de criminalidade – como assaltos, homicídios dolosos e latrocínio -, em particular em suas regiões mais urbanizadas, metropolitanas (Coelho,1988). Imagens de arrastões, tiroteios, conflitos entre policiais e traficantes, notícias sobre assaltos e homicídios passaram a fazer parte do repertório simbólico a partir do qual as cidades brasileiras são representadas.
Muitos fatores contribuíram para o aumento da criminalidade em nossas cidades, destacando-se a ampliação da venda e consumo de drogas – particularmente de cocaína -, patrocinados pelo cartel internacional de entorpecentes, e o comércio de armas a ele associado. A parcela mais visível desse esquema, sua ponta final responsável pela venda no varejo, se faz presente aqui, entre outras formas, através dos bandos armados que se instalaram nas favelas das grandes cidades. Os violentos conflitos provenientes desse negócio, decorrentes seja da disputa por territórios – as chamadas “bocas de fumo” – ou mesmo de traições internas aos próprios grupos, talvez se constituam como as práticas mais representativas da “violência urbana”, tornando as favelas – sempre tidas como um problema, mas anteriormente construído sobre outras bases -, o lócus privilegiado da violência nas grandes cidades.
Ao serem forçados a levar suas rotinas no mesmo local onde são desenvolvidas essas práticas violentas, os moradores de favelas seriam muitas vezes interpretados como cúmplices dos “bandidos” ou, em casos mais específicos (homens, jovens e negros), seriam “quase-bandidos”. Tais representações teriam levado grande parcela da população a apoiar ações truculentas e ilegais por parte da polícia contra os “favelados”.
As conhecidas particularidades da construção da cidadania no Brasil, invertendo a ordem descrita por Marshall (1963) para o caso da Europa (Carvalho, 2008), garantiram aos moradores de favelas, nos últimos anos, a expansão de seus direitos sociais e políticos; mas, entre as restrições impostas pelos bandos armados de traficantes e as constantes ações violentas por parte da polícia, a condição de subcidadãos dos moradores de favelas vem se intensificando (Leite, 2000), já que a eles nem os mais elementares direitos civis – direito à vida e direito de ir e vir – estariam garantidos na prática.
No presente trabalho temos como principal objetivo verificar se o fato de um indivíduo morar em favela aumenta suas chances de sofrer agressão física por parte de policiais; se o fizer, gostaríamos de mensurar o quanto aumenta, mesmo quando mantemos constantes outras características, tais como gênero, cor, idade, e nível socioeconômico.
A fim de fornecer respostas a estas perguntas utilizaremos dados provenientes do suplemento da PNAD 2009 (IBGE), que se constitui em uma representativa pesquisa de vitimização. O recorte utilizado será o das principais Regiões Metropolitanas Brasileiras. As Regiões Metropolitanas que são estatisticamente representativas na PNAD – e que, portanto, constituirão o recorte do presente artigo – correspondem a um total de 10 Metrópoles: Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador e Brasília, que está classificada também como região metropolitana, mas diz respeito apenas ao Distrito Federal.
Acesse o artigo completo “Moradores de favelas e violência policial: uma análise sobre vítimas de agressão física policial nas principais metrópoles brasileiras”, na edição nº 09 da revista eletrônica e-metropolis aqui.