Em entrevista para o Instituto Humanitas Unisinos, Luiz Cesar Ribeiro fala sobre os principais problemas em torno das metrópoles brasileiras, como ausência de uma gestão metropolitana; moradia e ocupação dos territórios; caos da mobilidade; e a necessidade de se pensar o bem-estar urbano para o desenvolvimento do país.
A entrevista “Metrópoles brasileiras carecem de governabilidade” foi publicada no dia 2 de agosto no site doInstituto Humanitas Unisinos; a ação faz parte do trabalho de difusão do tema metropolitano realizado pelo Observatório das Metrópoles a partir do diálogo com formadores de opinião, atores governamentais, iniciativa privada e sociedade civil.
ENTREVISTA: Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro, coordenador do Observatório das Metrópoles
“A cidade está sendo pensada mais como um fator econômico do que como um fator que promove bem-estar e justiça social, que são temas da reforma urbana” (Luiz Cesar Ribeiro)
IHU On-Line – A partir das pesquisas realizadas pelo Observatório das Metrópoles, é possível traçar um perfil das metrópoles brasileiras? Quais são as transformações recentes na organização do espaço urbano-metropolitano e, tendo em vista essas mudanças, como define a atual situação urbana brasileira?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – O primeiro ponto desse perfil é a constatação de que temos pelo menos 12 metrópoles na rede urbana brasileira. Metrópoles para nós significa um aglomerado urbano que tem um papel de relevância econômica e política na rede urbana, como um lugar de direção, de poder, de concentração de riquezas e de serviços. Então, não é apenas uma grande cidade, mas é uma cidade que tem uma função específica na rede urbana.
Nesse sentido, existem 12 metrópoles dentro do país, segundo a identificação a partir de uma série de parâmetros e indicadores. Sobre essas metrópoles, que têm relevância econômica, política e social, não existe nenhum sistema de governabilidade. Trata-se de territórios que não são submetidos a uma autoridade pública que possa exercer alguma função de governo. Há muitos governos e muitos atores do mercado vivendo e participando desse território, mas não existe uma autoridade pública. Assim, esse é o primeiro perfil que podemos identificar no cenário metropolitano brasileiro: a ausência de um sistema de governabilidade desses territórios relevantes.
Governabilidade
O segundo ponto de um perfil das metrópoles é que esses territórios vêm mudando recentemente na direção de uma dinâmica mais impulsionada pelo mercado do que já foi no passado, contra a face da inexistência de uma autoridade pública, de um sistema de governabilidade desses territórios, que possam gerar políticas públicas. Na ausência dessas políticas, a dinâmica do mercado em geral acaba prevalecendo ainda mais do que já prevaleceu no passado, reconfigurando, delimitando e dando as direções para onde esses territórios estão crescendo e as formas de crescimento, de expansão desses territórios.
As intervenções públicas que existem acabam impulsionando essa própria lógica do mercado, como, por exemplo, as intervenções dentro da política do Programa Minha Casa, Minha Vida, que acabam impulsionando as forças do mercado. Por outro lado, é um território muito marcado por uma dinâmica sociodemográfica que poderia ser descrita como a consolidação de um padrão de segregação residencial, significando que esse território é muito marcado por desigualdades sociais em termos de acesso ao bem-estar urbano, o qual é fundamental para viver nessas grandes metrópoles — porque quando falamos de bem-estar urbano, estamos falando de acesso a uma série de serviços e equipamentos que dão conta das necessidades urbanas que são fundamentais para se viver nesses aglomerados, que vai desde as necessidades de mobilidade, de um meio ambiental adequado, de moradia, enfim, todos os elementos dos serviços públicos ligados ao fato urbano.
Esse bem-estar que seria gerado pela prestação de serviços públicos é escasso pela ausência de serviços com a qualidade necessária. Além de serem escassos, eles acabam sendo apropriados pelos segmentos sociais que conseguem controlar os territórios onde esses equipamentos e serviços estão mais concentrados, e isso fez com que aumentasse a saída das populações mais pobres das áreas mais abastecidas deste bem-estar para áreas menos abastecidas. Por isso, a população mais pobre tende a sair dessas áreas, e a segregação tem se acentuado. Isso tem uma consequência em termos de desigualdades sociais e no acesso a esse bem-estar urbano.
IHU On-Line – O senhor costuma dizer que o que vem ocorrendo em muitas das nossas cidades indica a manutenção parcial da lógica da modernização conservadora, resultando em uma governança empreendedorista. Pode nos explicar como se dá essa lógica de modernização conservadora? Ela gera essa segregação nas cidades, como o senhor menciona?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – É a ideia de que temos um Estado que se democratiza, se torna mais competente em termos de prestação de serviços, se moderniza, mas se moderniza de maneira a conservar, em seu interior, uma lógica política fundada no clientelismo, no fisiologismo e em todos esses padrões tradicionais de relação política entre a sociedade e o Estado. Então, nas áreas mais carentes, mais segregadas, acaba prevalecendo esse padrão clientelístico de acesso da população aos serviços. Está aí a ideia de modernização conservadora. A própria desigualdade e segregação associada a essa desigualdade reproduzem essa dimensão conservadora, fazendo com que o processo político de modernização, de construção da cidadania da capacidade da população de reivindicar de maneira autônoma, não se concretize plenamente na cidade. Acaba se reproduzindo um padrão quase que “agrário” de relação política entre a população e o Estado.
IHU On-Line – A moradia é um dos principais problemas das cidades. Qual a dificuldade em torno da resolução dessa questão ao longo dos planos de habitação implantados no Brasil? Como o senhor vê nesse sentido o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto e programas sociais tal como o Minha Casa, Minha Vida, no que se refere à questão da moradia?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – O programa Minha Casa, Minha Vida não é uma política de moradia; é uma política de impulsionamento através do setor da construção civil, da economia, pelo impacto que esse setor tem. Então, impulsionando a construção civil, se impulsiona a economia, e impulsionando a economia, se impulsiona o emprego e a renda. Impulsionando o emprego e a renda, se impulsiona o voto.
Assim, a política habitacional brasileira está muito atrelada aos interesses políticos de manter a coalisão que comanda o país há algum tempo — e não é só de agora, é algo de certa duração — e, ao mesmo tempo, impulsiona o setor da construção civil, que tem uma grande importância na própria coalisão. Programas como esse impulsionam a construção de habitações em determinados locais e condições que não são exatamente aqueles que deveriam prevalecer em uma política habitacional orientada de maneira mais forte para promover o bem-estar urbano.
Estamos vendo conjuntos habitacionais construídos em lugares que não são adequados, concentrando populações em bairros, reproduzindo modelos que nós já sabemos que não dão certo — estes conjuntos habitacionais gigantescos —, às vezes até colocando a população em lugares de baixo grau de acesso ao bem-estar urbano, em razão dessa lógica que prevalece, que não é exatamente a lógica de uma política habitacional. Trata-se de uma política que gera a dinâmica da construção civil, que gera emprego, gera renda e gera voto.
Então, está se promovendo a moradia, mas não a cidade; estão se promovendo os interesses políticos e os interesses econômicos. Era possível fazer diferente. Nesse sentido, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto tem um papel importante de politizar esse tema, de abrir a discussão na sociedade sobre outras formas de fazer essa política; formas tanto de redesenhar a política praticada diretamente pelo Estado, como de um projeto alternativo associado ao movimento de construção corporativa, de construção por crédito solidário, que tem produzido em escala muito menor, evidentemente, mas trata-se de alternativas que poderiam ser usadas. Esse movimento tem o papel importante de politizar essa questão e a capacidade de colocar em pauta outras bandeiras associadas ao tema da moradia, ao tema da terra, que estão relacionados ao direito à cidade.
IHU On-Line – O que seria um programa de moradia tendo em vista a situação de moradia das metrópoles? Tem que ter mais interferência do Estado ou a intervenção estatal mostra que a atuação do Estado não foi eficiente?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – Teria de haver mais intervenção pública. Na verdade, quem comanda a política não é a lógica pública, mas a lógica privada. Tem pouco Estado, e isso resulta no modelo que decide o que fazer, onde fazer e como fazer, que leva em consideração o interesse privado e não o interesse público. Nesse sentido, tem de haver mais Estado planejando e regulando, porque não adianta estarmos construindo moradia sem regular o uso do solo, o que permite às pessoas estarem na cidade sem serem submetidas de maneira muito forte à lógica do mercado.
Essa é uma questão que tem a ver com a ideia do direito à cidade. Então, regular o uso do solo para que ele possa ser usado segundo esse conceito que está na Constituição Federal, da função social da propriedade e da cidade, é um papel importante que o Estado teria de exercer nos planos federal, estadual e municipal. Mas isso não está sendo feito, pelo contrário, as intervenções que têm acontecido nessas três esferas são totalmente dissociadas desse conceito da função social da cidade, que só se materializa se houver um sistema de regulação pública de desocupação do solo, que seja orientado pelos valores da justiça, da sustentabilidade, do equilíbrio, da acessibilidade.
IHU On-Line – Como o senhor se manifesta diante dos discursos de que se deve melhorar a infraestrutura e a vida nas favelas? Isso quer dizer que as favelas são uma realidade no sentido de que será impossível reestruturá-las?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – Não é impossível de forma nenhuma transformar as favelas. Aliás, elas vêm sendo transformadas ao longo do tempo, por força do próprio mercado ou por certos experimentos de política. As favelas hoje não são mais aquelas dos anos 40, 50 e muito menos as primeiras favelas. Hoje há mais imóveis permanentes, mais serviços, mais estruturação do espaço, e isso resulta tanto de ações espontâneas como de algumas políticas ao longo do tempo, as quais promoveram a transformação desses espaços. Então, por um lado ou por outro, há indícios de que é possível ter uma estratégia de desenvolvimento urbano que incorpore esses territórios às cidades de maneira plena, sem que isso signifique o que está acontecendo hoje: o deslocamento dessa população para outros locais.
O problema das favelas não é um problema que não tem solução; tem solução, aliás, tem tido solução. Nem todas são boas, porque a boa solução é manter uma característica das grandes cidades brasileiras hoje — que era talvez a marca do Rio de Janeiro —, que é esse modelo urbano que ainda não separou de maneira radical os “de baixo” e os “de cima” em termos de localização de território. Todas as grandes cidades que passaram por um certo tipo de modernização, de crescimento, não são grandes cidades, mas acabaram gerando um distanciamento radical entre os “de cima” e os “de baixo”, os ricos e os pobres, os integrados e os excluídos. O Brasil tem essa marca que tem a ver com a presença das favelas e a localização delas. Isso dá característica à cidade brasileira e até é importante ser mantida, porque permite a interação urbana, a sociabilidade, de maneira muito mais rica do que uma cidade totalmente segregada, como são algumas cidades americanas, as cidades europeias e algumas cidades latino-americanas, como Buenos Aires, Santiago do Chile, Montevidéu. Essas são cidades que já têm como marca a separação radical no território. Considerando que a diferença social, cultural, étnica e racial é uma riqueza em termos sociais, não haveria essa circulação de recursos, aprendizado mútuo, tolerância, capacidade de reconhecimento do outro, de autoridade, se essa característica das cidades brasileiras fosse perdida.
Então, a ausência de uma estratégia está desmanchando essa característica muito marcante da sociedade brasileira, que antes era algo muito característico da formação do Rio de Janeiro, e que de certa maneira disseminou-se pelas cidades de maneiras diferentes. No Sul do país, por exemplo, isso é diferente, porque as separações são mais fortes e a história também é diferente. As cidades do Nordeste brasileiro, por outro lado, têm essa mistura social de território. Isso é um produto genuinamente brasileiro, que produz uma riqueza de sociabilidade, de interação, que nós deveríamos preservar e que tem um impacto social muito importante. Nós não teríamos o samba como uma invenção coletiva se não houvesse essa miscigenação social e étnica que a cidade promoveu e propiciou entre a classe média, a classe média intelectual e os populares.
IHU On-Line – Mas independente da cultura presente nas cidades, tem de se levar em conta que todos tenham condições mínimas de moradia. Como manter essa miscigenação de culturas e garantir acesso à moradia adequada, uma vez que as classes populares das favelas geralmente não têm uma condição de vida digna nas metrópoles?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – É claro. Isso que eu disse não significa que devemos manter as favelas exatamente da forma que estão hoje, porque elas melhoraram de vários pontos de vista, mas pioraram de outros. Elas pioraram, por exemplo, no hiperadensamento da ocupação das favelas, seja no plano da moradia, seja no plano do território. Então, seria possível manter as características das cidades brasileiras fazendo reformas urbanas que reestruturassem esses territórios gerando uma condição mais favorável, mas não ao preço de mudar o conteúdo deles, o que tem acontecido especialmente no Rio de Janeiro. Ou seja, há uma mudança que transforma esses territórios em termos morfológicos, mas também transforma em termos sociais pela ausência de uma estratégia que tenha como eixo uma intervenção preocupada com a manutenção de um determinado padrão de urbanidade.
IHU On-Line – Hoje não se oferecem melhores condições para que as classes populares se mantenham nos grandes centros, mas elas são retiradas dos centros urbanos. É isso?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – Exatamente. Se dessem a titulação plena das propriedades, e se reformassem essas moradias, não precisaria fazer um programa como o Minha Casa, Minha Vida; basta fazer um sistema de crédito que dê acesso aos moradores a um dinheiro financiado, que possibilite que eles mesmos façam as reformas em suas casas. Isso poderia estar associado a uma certa orientação técnica para que essa reforma respeitasse determinados princípios urbanísticos que gerassem um meio urbano mais favorável, menos ameaçado, com menos problemas sanitários, de higiene e ambientais do ambiente construído. A população sabe fazer isso, não precisa de uma empresa. Seria mais adequado se tivesse uma linha de financiamento de reforma urbana da favela, em que os moradores poderiam ter acesso a um crédito que financiaria a reforma de casas, a reforma dos quarteirões das favelas. Isso seria muito mais interessante do que desenvolver um programa como o Minha Casa, Minha Vida. Reformar e adaptar “o popular” do brasileiro seria mais interessante para nós do que construir novas coisas, não sei onde, de maneira que ninguém sabe e com um custo que ninguém conhece.
IHU On-Line – Programas habitacionais como Minha Casa, Minha Vida reforçam a segregação das metrópoles?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – O que está acontecendo é isso. São grandes conjuntos produzidos e financiados pelo poder público, com financiamento inclusive subsidiado por alguns segmentos, mas a decisão é uma decisão empresarial, ou seja, a rentabilidade comanda a decisão, e por esse motivo se constrói onde é mais barato. É mais barato porque se constrói com um preço da terra mais baixo e é mais barato porque se constrói massivamente, se ganha escala. Minha Casa, Minha Vida é a reprodução do que nós já conhecemos do Banco Nacional da Habitação – BNH dos grandes conjuntos habitacionais das periferias.
IHU On-Line – Além da questão moradia, quais são as maiores dificuldades das metrópoles, por exemplo, em relação à mobilidade urbana?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – Mobilidade urbana, mobilidade urbana e mobilidade urbana. Mas quando se fala em mobilidade urbana, tem de se discutir o que nós entendemos por isso. Mobilidade urbana só começa a ser uma questão bem colocada como uma questão de política pública quando, primeiro, se tem um sistema de massa de transporte sobre a tutela pública — seja metrô, seja trem suburbano, seja até numa escala menor, o Bus Rapid Transit – BRT. De todo modo, esse sistema tem de ser um sistema público, pensado como um organizador de todos os modais de mobilidade, para podermos ter uma política que não responda apenas aos problemas já colocados, mas que resolvam inclusive os problemas que poderão ocorrer no futuro, caso não haja uma política pública. O ideal é associar esse sistema a outras maneiras de mobilidade individual e privada, mas organizando, subordinando isso a uma política que organize o território e os eixos fundamentais dessa mobilidade.
O problema de mobilidade tem sido muito discutido em função do inchaço automobilístico das cidades. Parte dos problemas de mobilidade tem a ver com esse inchaço automobilístico, mas isso já é o resultado da ausência de uma política de transporte público. Então, a mobilidade é a outra questão central que está colocada nas metrópoles, mas ela tem de começar a ser discutida por esse tema associado à discussão da necessidade de um sistema coletivo, portanto, de massa, sobre a tutela pública. Nesse sentido, também é preciso regular os sistemas coletivos privados, ter um sistema em que o Estado atue de maneira mais regulatória.
IHU On-Line – Diante disso o senhor vê alguma proposta de reforma urbana sendo desenvolvida no Brasil ou sendo pensada diante da situação das metrópoles?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – Não. Existem movimentos, intenções, debates, mas o tema da reforma urbana hoje tem sido deslocado por outro tema, que é a ideia da cidade empreendedora, competitiva, a cidade de uma economia endógena, dos megaeventos, do turismo. A cidade está sendo pensada mais como um fator econômico do que como um fator que promove bem-estar e justiça social, que são temas da reforma urbana. As cidades de hoje estão muito mais submetidas a uma lógica que é de antirreforma urbana do que sendo geridas em torno da ideia de reforma urbana. Menciono mais uma vez o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto como um papel importante em tentar trazer essa pauta novamente para a centralidade da agenda pública, até tentando falar para os empresários que, no imaginário brasileiro, o sertão viraria mar, assim dizia a poesia, mas o que está acontecendo é que o mar está virando sertão; é o que está acontecendo em São Paulo.
IHU On-Line – Retomando a questão da ausência de governabilidade das metrópoles, em que consistiriam novos modelos de planejamento e gestão das nossas cidades?
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – Existem vários modelos possíveis, inclusive no cenário internacional das experiências de construção de autoridades públicas sobre territórios metropolitanos, os quais se adaptam a contextos políticos e institucionais diferentes. Quando se fala em país unitário, a questão metropolitana tem de ser pensada diferente de quando se fala de um país federativo. Ao falar de uma metrópole que economicamente é fundamentada no centro da rede urbana, como São Paulo, tem de levar em consideração isso, ao contrário de quando se fala de uma metrópole que é importante, mas é periférica. Então, a importância do setor econômico não é a mesma. Nesse sentido, existem modelos diferentes considerando essas diferenças políticas institucionais e econômicas das metrópoles, mas todas elas se resumem à questão de como construir uma autoridade pública — e autoridade pública significa dizer alguém que é responsável por, que responde por e que representa o que é a metrópole, que seja capaz de gerar políticas sobre esse território, fazendo os entes das esferas públicas cooperarem internamente, fazendo com que a política de saneamento coopere com a política habitacional, que a política habitacional coopere com a política de transporte.
Trata-se, portanto, de uma autoridade que tenha o papel, primeiro, de ser representante da responsabilidade pública da ação sobre aquele território, seja que modelo for, e ao mesmo tempo seja a autoridade pública que representa o problema metropolitano; isso é central. O formato, a engenharia institucional de como dar conta disso vai ser variado. Pode haver um modelo para São Paulo, um modelo para Recife, etc. Essa autoridade pública deve ter, contudo, o papel de ser a responsável pública pela ação daquele território, tem de ter esse papel de representação da questão da metrópole no cenário regional, nacional, ser a expressão de uma estratégia de desenvolvimento que possa orientar as ações dos atores do Estado, da sociedade e do mercado. Então, o formato que isso toma, se é uma agência de desenvolvimento, se é uma fundação, se é o novo livro do governo, são soluções institucionais e políticas distintas, mas qualquer uma que seja, se não tiver essas características, não vai ter governabilidade. O que vai dar legitimidade a essa entidade criada é a legitimidade funcional, legitimidade política, legitimidade social. Nós já tivemos e temos ainda em vários lugares, “autoridades” metropolitanas destituídas da capacidade de ação justamente porque lhes falta essa legitimidade.
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Entrevista realizada por Patrícia Fachin (IHU)