Metrópoles brasileiras: diversificação, concentração e dispersão
O coordenador nacional do INCT Observatório das Metrópoles, Luiz Cesar Ribeiro, e os pesquisadores Érica Tavares e Juciano Rodrigues, abordam neste artigo a diversificação do fenômeno metropolitano devido à complexidade da rede urbana no Brasil e à mudança da própria definição de metrópole. A análise começa pelo processo de urbanização brasileiro dos anos 50 aos anos 90, passa pelo Brasil metropolitano e a sua polarização de territórios, como também pela dupla dinâmica de concentração/dispersão, e discute, na última parte, a dimensão da mobilidade urbana, que tem se constituído em um verdadeiro drama brasileiro.
Metrópoles brasileiras: diversificação, concentração e dispersão
Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro¹
Érica Tavares da Silva²
Juciano Martins Rodrigues³
O Brasil ultrapassou a primeira década do século XXI com mais de 190 milhões de pessoas. Deste total, em torno de 36% estava em espaços considerados metropolitanos, onde residiam quase 70 milhões de brasileiros em pouco menos de 300 municípios, segundo definição utilizada pelo Observatório das Metrópoles (RIBEIRO, 2009). O conceito de metrópole que trabalhamos neste artigo refere-se a aglomerados urbanos que apresentam as dimensões de polarização e concentração no território brasileiro nas escalas nacional, regional e local. A metrópole é identificada então como um espaço urbano com características metropolitanas que, internamente, também apresenta uma hierarquização, já que é um aglomerado com concentração de poder econômico, social, cultural que não é semelhante para todos os espaços, no caso, municípios nele inseridos. Entretanto, tais espaços apresentam níveis de integração à dinâmica do aglomerado correspondente, maior ou menor conforme o município. Para tanto, operacionalizamos esse conceito, segundo diversos indicadores para cada dimensão considerada, operacionalização esta que será tratada no decorrer do texto. Já ao falarmos em região metropolitana, estaremos nos referindo aos espaços institucionalizados oficialmente como tais.
Nessa perspectiva, observando o quadro atual da distribuição populacional no País, ainda permanece a concentração demográfica nas cidades primazes, com o surgimento de novos aglomerados urbanos metropolitanos, ou seja, há uma difusão do fenômeno da metropolização. Nestes espaços, ao analisar a dinâmica da estrutura produtiva, mercado de trabalho e população, observam-se processos que ora parecem se complementar ora parecem se contrapor. Tais processos se referem à própria organização interna dos espaços metropolitanos. Por exemplo, ao mesmo tempo em que as periferias metropolitanas apresentam ritmos de crescimento maiores e imigração bastante expressiva vinda do núcleo, estes mesmos núcleos apresentam um incremento populacional ainda muito considerável, além de concentrarem também boa parte dos empregos, o que evidencia que ainda temos uma relativa pressão sobre as áreas centrais que ocorre simultaneamente a uma dispersão populacional para as periferias, com tendência à formação de tecidos urbanos cada vez mais espraiados.
Para abordar esses aspectos, o artigo está estruturado em quatro seções. Na primeira, apresentamos de maneira sintética o processo de urbanização brasileiro dos anos 50 aos anos 90 aproximadamente, cuja principal característica é a precoce metropolização da rede de cidades. Nessa retomada, buscou-se ainda relacionar a dinâmica econômica e demográfica, assim como alguns aspectos sociais, políticos e espaciais sobretudo nos espaços metropolitanos, até os anos 90, marcados pela passagem de um período de intensas intervenções públicas nos grandes aglomerados urbanos, com um Estado centralizador, para uma crise do modelo de substituição de importações e condições muito adversas no que se refere ao desenvolvimento econômico, mercado de trabalho, acesso à moradia etc., que afetaram em grande medida justamente os espaços metropolitanos. Em linhas gerais, essa retomada passa pela acelerada urbanização associada à industrialização por substituição de importações; pela crise deste modelo e emergência de uma política neoliberal em torno de 1980 a 1996, em um contexto de hiperinflação, desemprego, informalização, expansão por ciclos etc.; por uma fase posterior de estabilização de 1996 a 2005, em que se afirma a política neoliberal, com reforma do Estado, crescimento baixo e em ciclos pautados pelas crises internacionais; e por um período mais recente de 2005 a 2010, em que ocorrem crescimento econômico, distribuição da renda, dinamização do mercado interno, retomada da política da moradia etc., mas continuidade da política neoliberal.
Na seção seguinte, abordamos o contexto metropolitano em período mais recente. Como já dito, apresentamos definições e operacionalização para o que seja metropolitano no Brasil contemporâneo, baseando-se na capacidade de polarização do território nas escalas nacional, regional e local, assim como na hierarquização interna de tais aglomerados, e em suas características quanto às novas funções de coordenação, comando e direção das grandes cidades na economia em rede.
Na terceira seção tratamos da organização interna dos espaços metropolitanos, na qual se identifica uma dupla dinâmica entre concentração/dispersão. Apesar de serem aparentemente contrários, observa-se que ao mesmo tempo em que ocorre uma expansão além das fronteiras metropolitanas e em seu espaço interno, também permanece a forte concentração nas áreas centrais, aspectos que podem ser explicados pela própria dinâmica demográfica característica de áreas mais urbanizadas, mas também pelas transformações urbanas no que se refere à moradia, mercado de trabalho e condições de mobilidade urbana.
Na última seção, trata-se mais especificamente desta dimensão da mobilidade urbana, que tem se constituído em um verdadeiro drama metropolitano. Esta dimensão também apresenta características complexas, pois, como já colocado pela literatura, ampliam-se os tipos de transporte, o sistema físico de circulação, e aumenta-se a proporção de automóveis por habitante, entretanto simultaneamente pioram as condições de mobilidade, aumenta-se o tempo de deslocamento, e o acesso ao transporte público pesa cada vez mais no orçamento das famílias, em especial as mais pobres. Portanto, esta parte é dedicada à análise de um tema que seria causa e consequência da dinâmica anteriormente descrita: os padrões de mobilidade urbana nas metrópoles.
Diante disso, este artigo tem por objetivo trazer mais um olhar para os processos que vêm ocorrendo no espaço urbano-metropolitano, ressaltando a importância de considerar distintas dimensões socioespaciais e escalas de análise em conjunto.
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¹Doutor em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (USP). Professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro – Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ). Coordenador Nacional do Observatório das Metrópoles: território, coesão social e governança. E-mail:lcqribeiro@gmail.com
²Mestre em Estudos Populacionais e Pesquisa Social pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE/IBGE). Doutoranda em Planejamento Urbano e Regional no IPPUR/UFRJ. Pesquisadora do Observatório das Metrópoles. E-mail: ericatavs@hotmail.com
³Mestre em Estudos Populacionais e Pesquisa Social pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE/ IBGE). Doutorando em Urbanismo no Programa de Pós-Graduação em Urbanismo (PROURB) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pesquisador assistente do Observatório das Metrópoles. E-mail:jucianom@gmail.com