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O Observatório das Metrópoles divulga a Conferência “Insurgência, planejamento e a perspectiva de um urbanismo humano”, proferido pela professora Faranak Miraftab (University of Illinois/EUA), que abriu o IV World Planning Schools Congress (Rio de Janeiro, 2016). Miraftab argumenta que o planejamento está se defrontando com sua própria crise de identidade e legitimidade, uma crise que emerge de sua esquizofrenia profissional, razão pelo que sua própria imagem e ideia da profissão não se encaixam. Segundo ela, o planejamento progressista necessita romper com os postulados que o conduziram a tal crise existencial, necessitando de uma virada ontológica na teorização das práticas. Na apresentação ela desenvolve a argumentação, abordando: a esquizofrenia do planejamento; práticas insurgentes; imaginação e a urgência em descolonizar o futuro.

A Conferência de Abertura do o IV World Planning Schools Congress (Rio de Janeiro, 2016)  “Insurgência, planejamento e a perspectiva de um urbanismo humano”, proferido pela professora Faranak Miraftab, foi publicada na Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais (v. 18, n.3, dez 2016). A tradução foi feita por Ester Limonad, docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense (POSGEO/UFF).

RBEUR

A Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regioanis pertence a ANPUR, Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional, fundada em 1983, que aglutina e representa programas de pós-graduação e centros de ensino e/ou pesquisa das áreas do planejamento urbano e regional, do urbanismo, da geografia, da economia, da administração pública, das ciências sociais, do direito, do desenvolvimento regional, entre outras.

O conteúdo da revista se dirige a um público multidisciplinar de professores, pesquisadores, estudantes e profissionais do campo do planejamento e dos estudos urbanos e regionais. Além de chamadas temáticas a revista mantém um fluxo contínuo de submissão de textos e resenhas para publicação.

Criada em 1999, em versão impressa e com periodicidade semestral, a revista se consolidou como principal periódico na área de Planejamento Urbano e Regional.

IV WPSC

O IV World Planning Schools Congress aconteceu, em julho de 2016 no Rio de Janeiro, e teve o IPPUR/UFRJ – membro da ANPUR – como responsável pela organização desta edição. Além disto, contou com a colaboração também de parceiros das faculdades de Geografia da UFF e da UFMG, do PROURB/UFRJ e do CEDEPLAR.

O Observatório das Metrópoles esteve presente no evento, com destaque para a sessão sobre megaeventos esportivos, com Orlando Alves dos Santos Jr. e Christopher Gaffney. E a sessão sobre a urbanização neoliberal com Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro.

A seguir um trecho da Conferência da professora Faranak Miraftab (University of Illinois/EUA)

Insurgência, planejamento e a perspectiva de um urbanismo humano

Obrigada por esta apresentação. Inicialmente, gostaria de agradecer à comissão organizadora do World Planning Schools Conference por me convidar para abrir esse importante diálogo entre colegas de todo o mundo. É uma verdadeira honra e um privilégio me dirigir a um grupo internacional de estudiosos de renome, sendo que com alguns dos quais continuo a aprender. Como sempre, o conhecimento é uma produção coletiva, e, portanto, o que compartilharei com vocês hoje são meus conhecimentos, adquiridos através do diálogo com ativistas e acadêmicos de várias partes do mundo.

Não preciso dizer a esta audiência que vivemos em um momento de crise, uma crise global que não é apenas uma crise do capitalismo, mas também do planejamento como uma profissão e como uma ideia. Por isso, a urgência de nossas conversações neste congresso mundial, para discutir como podemos repensar o planejamento, o qual é parte integrante da crise contemporânea, e imaginar práticas de descolonização que tornem possível um urbanismo humano.

A crise contemporânea é insidiosa e infecta todas as dimensões da vida, em todos os cantos do globo. Mas isso não significa que estamos todos nela da mesma forma; essas crises afetam as pessoas distintamente em diferentes lugares, de formas que são injustas e desiguais. Poderosas economias, que produzem a desumanidade das crises globais, entretanto raramente assumem a responsabilidade por sua criação.

A atual guerra no Oriente Médio e seu deslocamento global é um exemplo. Hoje, mais de 60 milhões de pessoas, ou seja, uma em cada 122 pessoas no mundo, foram expulsas de seus lares pela guerra e outros perigos, uma taxa de sofrimento pior do que em qualquer outro momento da história humana. Mas, enquanto o mundo tem os seus olhos em quase um milhão de fugitivos que enfrentaram o Mar Mediterrâneo para alcançar a Europa, apenas cerca de 300.000 receberam a assim chamada “hospitalidade europeia”. A grande maioria dos refugiados permanece próxima a seus lares, sem muita atenção global, em lugares como a Turquia, Jordânia, Líbano, Iraque, Irã e Egito, em campos de refugiados como Zaatari na Jordânia, os quais são agora uma característica permanente das cidades e uma forma de urbanização.

Essa é, de fato, a era do desterro global, seja por causa das guerras e do petróleo, seja por causa da ganância do capital imobiliário gerando espoliação e expulsão urbanas.

Enquanto Congresso Mundial das Escolas de Planejamento (WPSC – 2016, World Planning Schools Congress), os debates em que embarcamos nos próximos dias concernem a como nós, enquanto acadêmicos do planejamento, treinando as próximas gerações de profissionais de planejamento, respondemos e nos engajamos em relação a essas crises e injustiça.

Eu argumento que o planejamento está se defrontando com sua própria crise de identidade e legitimidade, uma crise que emerge de sua esquizofrenia profissional, razão pelo que sua própria imagem e ideia da profissão não se encaixam. Daí, portanto, a necessidade de um novo tipo de planejamento, de um novo significado e de uma nova imaginação. O planejamento progressista necessita romper com os postulados que o conduziram a tal crise existencial. Necessita de uma virada ontológica na teorização das práticas de planejamento. Alguns a designam de planejamento insurgente, outros, inclusive alguns de nossos colegas aqui no Rio de Janeiro, a chamam de planejamento conflitivo.

Nesta apresentação enfoco como tal ruptura ontológica na teorização das práticas de planejamento requer, em primeiro lugar, reconhecer o leque de práticas além das sancionadas pelo Estado e poderes corporativos – nomeadamente as práticas insurgentes; e em segundo lugar, requer descolonizar a imaginação e as possibilidades para o futuro. Para isso, precisamos recorrer às práticas subordinadas, amadurecidas em movimentos anticoloniais e anticapitalistas de longa duração. Aí encontraremos a inspiração, os valores e os princípios orientadores para práticas que podem promover um futuro e um urbanismo mais humanos.

Deixem-me desenvolver essa argumentação passo a passo. Eu o faço em três atos:

Ato I. entendendo a esquizofrenia do planejamento;
Ato II. práticas insurgentes como um tipo diferente de planejamento;
Ato III. imaginação e a urgência em descolonizar o futuro.

E, então, finalizarei com uma breve reflexão sobre o que tudo isso representa para o ensino de planejamento.

 

Leia a Conferência completa de Faranak Miraftab no site da Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais.

 

 Última modificação em 15-03-2017 19:36:31