A região portuária do Rio de Janeiro vive um movimento recente de proletarização do território. Segundo dados do Observatório das Metrópoles, 43% da população moram em favelas, e um elevado percentual de habitações é precário: 8% dos domicílios contam apenas com um ou dois cômodos (como um quarto sem banheiro, ou um quarto com banheiro), e 13% de domicílios com três cômodos (sala, cozinha e banheiro).
As pesquisadoras Mariana Werneck e Lívia Salles apresentam um relato sobre a penúltima reunião temática do processo de produção do Plano de Habitação de Interesse Social do Porto (PHIS Porto) foi realizada na última quinta-feira, dia 02 de julho. Destinada às melhorias habitacionais, a reunião seguiu o modelo das demais, com uma exposição das propostas iniciais pelo presidente da CDURP, Alberto Silva, e a abertura para as falas do público presente.
Direito à Cidade e Monitoramento do Porto Maravilha
O Observatório das Metrópoles vem desenvolvendo o projeto “Estratégias e instrumentos de planejamento e regulação urbanística voltados à implementação do direito à moradia e à cidade no Brasil”, com financiamento da Fundação Ford.
A pesquisa visa monitorar e influenciar políticas nos municípios do Rio de Janeiro, São Paulo e Fortaleza com foco na função social da propriedade, inclusão socioterritorial da população de baixa renda e ampliação do acesso aos serviços urbanos. Integram o projeto o LabHab de Fortaleza, coordenado pelo profº Renato Pequeno também pesquisador da Rede Nacional Observatório das Metrópoles; e o LabCidade (FAU/USP), coordenado pelas professoras Raquel Rolnik e Paula Santoro.
A pesquisa sobre Direito à Cidade no Rio de Janeiro tem como foco as obras de revitalização da zona portuária da cidade, chamado Projeto Porto Maravilha. O recorte principal é avaliar as ações voltadas para a habitação de interesse social no porto e a forma como as famílias que já viviam na região estão participando do processo.
O artigo “Habitação de Interesse Social no Porto Maravilha: que melhorias habitacionais?”é parte dos resultados da pesquisa, e tem como propósito ampliar o debate sobre HIS no território urbano do Rio de Janeiro e a construção de uma cidade mais democrática.
Habitação de Interesse Social no Porto Maravilha: que melhorias habitacionais?
Mariana Werneck
Livia Salles
A penúltima reunião temática do processo de produção do Plano de Habitação de Interesse Social do Porto (PHIS Porto) foi realizada na última quinta-feira, dia 02 de julho. Destinada às melhorias habitacionais, a reunião seguiu o modelo das demais, com uma exposição das propostas iniciais pelo presidente da CDURP, Alberto Silva, e a abertura para as falas do público presente.
De acordo com a apresentação, o programa de melhorias habitacionais pretende subsidiar reforma, ampliação e recuperação dos domicílios, além de orientar processos de autoconstrução, e terá como público-alvo famílias com renda de até três salários mínimos. A promoção da regularização fundiária para famílias que vivem em situação irregular também é um objetivo, e serão priorizados os assentamentos objetos de conflitos fundiários. Dados levantados pelo diagnóstico, que apontam a existência de 2.822 domicílios particulares próprios com renda entre R$ 1,00 e R$ 1.600,00 (151 na Saúde, 1394 na Gamboa, e 1277 no Santo Cristo), já indicariam o escopo do programa.
Os recursos para execução das melhorias habitacionais ainda não estão definidos, mas é prevista a utilização de receitas advindas dos cofres municipais, em parte propiciadas pelo Morar Carioca, e federais, a partir do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS) e do Minha Casa, Minha Vida (MCMV). Alberto ainda garante que, apesar de a Lei Complementar 101/2009 não carimbar verba para tais medidas, a CDURP vem destinando recursos para ações de regularização fundiária e melhorias habitacionais.
O programa de melhorias habitacionais é de fundamental importância para a região, conforme dados produzidos pelo Observatório das Metrópoles aqui, mais uma vez, apresentados. Na região portuária, 43% da população moram em favelas, e um elevado percentual de habitações é precário: 8% dos domicílios contam apenas com um ou dois cômodos (como um quarto sem banheiro, ou um quarto com banheiro), e 13% de domicílios com três cômodos (sala, cozinha e banheiro). O quadro atual reflete o movimento recente de proletarização da região.
Melhoria habitacional também requer equipamentos e serviços públicos
As melhorias habitacionais não se reduzem ao combate dos problemas de habitabilidade das casas, como espaços apertados e mal ventilados ou instalações sanitárias precárias. Para elevar a qualidade de vida da população, é preciso formular intervenções que resultem tanto na melhoria da moradia quanto do ambiente urbano, o que inclui os equipamentos e serviços públicos.
O primeiro passo, então, é a inclusão ao diagnóstico dos equipamentos e serviços públicos existentes na área, de modo que seja possível indicar eventuais deficiências no atendimento à população. Uma delas já foi apontada na reunião: a ausência de escolas públicas de ensino médio na região. Segundo um morador da Saúde, a antiga escola República da Colômbia hoje é sede do Conselho Estadual de Direitos da Mulher (CEDIM), e as instalações do atual Centro Cultural José Bonifácio, restaurado recentemente com a operação urbana, também já abrigou uma escola secundarista que foi desativada. Sem acesso à rede pública no próprio bairro, os jovens se deslocam até mesmo à Zona Sul para estudar.
Mas, para além da identificação dos passivos existentes, também é preciso projetar a sua ampliação, já que é esperado que a região portuária receba 70 mil novos moradores nos próximos dez anos. Este compromisso demandará a articulação entre os entes federados, no cumprimento de suas distintas competências, para alcançar uma provisão adequada dos diferentes equipamentos e serviços públicos.
Mais informações para o diagnóstico
Durante a reunião, o arquiteto da Fundação Bento Rubião, Felipe Nin, entregou à CDURP um minucioso levantamento de terrenos e imóveis públicos e privados, com a indicação daqueles vazios e/ou subutilizados, de seus proprietários, e até mesmo de sua situação jurídica. Produzido pela Secretaria Municipal de Habitação entre 2008 e 2009, o levantamento havia sido entregue à Fundação para subsidiar a elaboração do Plano Municipal de Habitação de Interesse Municipal.
As informações disponibilizadas são preciosas, uma vez que a identificação dos terrenos e imóveis não só permitem a expansão dos projetos de habitação de interesse social como também a criação de novas Áreas de Especial Interesse Social. O levantamento ainda facilita ações de regularização fundiária, já que é provável que muitos destes imóveis sejam ocupados irregularmente por moradores que lá estão há mais de cinco anos, e, portanto, têm direito à usucapião especial de imóvel urbana. De acordo com Felipe, a área total destes terrenos chega a 150 mil m²
Começa a se desenhar uma Conferência Municipal
Outro momento importante da reunião foi a apresentação da proposta de uma Conferência Municipal por movimentos de moradia e organizações da sociedade civil, uma demanda que o Observatório das Metrópoles vem defendendo ao longo desse processo. Alberto inclinou-se favoravelmente à sua realização, além de contar com o apoio de muitos participantes.
A proposta já havia sido colocada na última reunião do Conselho Gestor do Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social, que, por determinação de decreto, tem a prerrogativa de aprovar o PHIS Porto. Para Cláudio Pereira, da União Nacional por Moradia Popular, e Marcelo Edmundo, da Central de Movimentos Populares – ambas entidades com assento no Conselho –, a ideia foi bem recebida pelo secretário de Habitação, Carlos Portinho.
A realização de uma Conferência Municipal, localizada na própria área portuária, é um momento fundamental para democratizar as discussões. Também é uma responsabilidade daqueles que pretendem transformar a estrutura de participação na elaboração do PHIS Porto em projeto-modelo, a ser replicado nas demais operações urbanas em todo o Brasil. Nesse sentido, o documento a ser elaborado pela CDURP, como resultado deste ciclo de reuniões, deve se constituir em uma pré-proposta, a ser debatida e deliberada pela população.