Neste artigo da Revista e-metropolis nº 25, Carlos Gonçalves analisa os sistemas urbanos através de três dicotomias: hierarquia/rede; monocentrismo/policentrismo; fracionamento/complexidade, e busca afirmar a necessidade de articular essas dicotomias para melhor compreender e potenciar as dinâmicas urbanas recentes. A ossatura desenhada para sustentar o corpo do artigo compreende, num primeiro momento, discussões em torno da hierarquia e da intrusão gradual das lógicas de rede. Depois, sistematizam-se os principais traços do policentrismo, enquanto proposta de potenciação de interações.
Entre hierarquia e redes
Por Carlos Gonçalves
O impulso para povoar é o interruptor genético dos sistemas urbanos. Para os que primeiro experimentaram fixar-se, os sítios de paragem permitiram explorar relações de proximidade e facilitar a obtenção de mantimentos. Esta mutação civilizacional conduziu a delimitações mais rigorosas dos territórios de caça e das áreas de recolha dos recursos necessários à vida quotidiana. Fomentou, também, a escolha dos espaços mais adequados à agricultura. Neste processo de definição da região “subordinada” ao povoado, o grupo fundador contacta com outros semelhantes, estabelecendo-se espaços de fronteira ao longo dos quais se disputavam recursos. Esta fórmula alterar-se-á à medida que se instala a percepção de que cooperando, aumentam-se as perspetivas de sobrevivência. Antevê-se aqui o embrião dos sistemas urbanos: um povoado, uma área subsidiária, bandas de negociação de fronteiras, fluxos internos, contactos e trocas com o exterior.
Foram criados assentamentos para aumentar as capacidades de resistir a ataques de inimigos, para aproveitar circunstâncias favoráveis de acesso a vias de comunicação ou para explorar tipos específicos de recursos naturais. Com o tempo, as interações que daí resultaram conduziram à segmentação das atividades e ao correspondente incremento da prosperidade (e da predisposição para a atingir) destas comunidades. O aprofundamento de tais processos segue a par com a proliferação e crescimento das aglomerações urbanas. A partir de pequenos aglomerados, o dispositivo urbano expande-se, dando lugar a vilas (villages) que por sua vez se transformam em pequenas cidades (towns). A agregação destas últimas origina formas mais extensas e complexas, designadas por metrópoles, megalópoles, cidades globais (“gigalopolis”). Todavia, é usual que as aglomerações urbanas tenham uma, ou várias, cidades como referência, estabelecendo-se a partir dela(s) uma teia (mais ou menos hierarquizada) de relações (Batty, 2005).
Procurando acompanhar os padrões de urbanização recentes, vemos surgir novos modelos empíricos agarrados a neologismos conceptuais que rotulam as configurações que se propõem modelar. Colocando de parte os organismos urbanos de maior abrangência (megalópole, metrópole, área metropolitana), as cidades ditas médias ou (se se optar por outra aproximação) intermédias, podem ser polinucleadas, podem funcionar numa conurbação, ou podem estar inseridas em áreas metropolitanas. Podem ainda ser categorizadas como históricas, podem ser tecnopolos, ter matriz logística, portuária, turística etc., ou dilatar a sua influência funcional por vastas áreas de baixa densidade criando padrões de urbanização difusos, fragmentados, dispersos, com maior ou menor suburbanização, periurbanização, rurbanização.
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Publicado em Artigos Científicos | Última modificação em 21-07-2016 21:28:19