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Ocupação em Passo Fundo (Crédito: Sul21)Ocupação em Passo Fundo (Crédito: Sul21)

O INCT Observatório das Metrópoles divulga o lançamento do livro “Experiências de mediação de conflitos fundiários no Brasil”, produzido pelo Centro de Direitos Econômicos e Sociais – CDES Direitos Humanos. Organizada por Cristiano Müller e Karla Fabrícia Moroso de Azevedo, a publicação é resultado do Seminário sobre Experiências de Mediações de Conflitos pelo Poder Público, e conta com a colaboração do profº Paulo Roberto Rodrigues Soares que assina o artigo “A construção de espaços democráticos nas cidades na era da financeirização”.

No dia 08 e 09 de dezembro de 2016 o CDES Direitos Humanos realizou o Seminário sobre Experiências de Mediações de Conflitos pelo Poder Público. Essa atividade foi realizada juntamente com a Terra de Direitos, uma organização não governamental de direitos humanos sediada no Paraná, e com o Fórum Sul de Reforma Urbana. A atividade reuniu experiências de mediação dos estados do Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais e Piauí.

Com o propósito de dar bases para a discussão, o Seminário contou também com a participação do Observatório das Remoções da FAU-USP, do Observatório das Metrópoles – Núcleo Porto Alegre e do Escritório Modelo da PUC/SP.

Para provocar o debate e a reflexão, foram convidados debatedores de várias partes do Brasil. Além disso, o Fórum Sul de Reforma Urbana trouxe participantes do Paraná, Santa Catarina e interior do RS, a fim de que o Seminário servisse como atividade de formação para os seus integrantes. O CDES Direitos Humanos tem agora o desafio de tentar traduzir os debates realizados no Seminário e consolidar essa experiência na forma de uma publicação do livro sobre experiências de mediação de conflitos fundiários.

Segundo Cristiano Müller, o livro ajuda a compreender que os conflitos fundiários urbanos são um grave problema social e que não serão resolvidos com os despejos e com violência policial. “O que está no centro de um processo de mediação de conflitos fundiários urbanos, a dignidade humana ou a propriedade privada? Quem está no centro dos processos de mediação: as comunidades e as pessoas ou os imóveis públicos e privados ociosos e que não cumprem a sua função social?”, pergunta em seu artigo.

Centro de Direitos Econômicos e Sociais – CDES Direitos Humanos é uma organização não governamental fundada em 2001 dentro do ambiente social e político de realização do I Fórum Social Mundial que ocorreu na cidade de Porto Alegre naquele ano. O CDES pauta sua atuação na defesa e promoção dos direitos humanos econômicos, sociais, culturais e ambientais, realizando trabalhos e atividades de inclusão social e assessorando juridicamente movimentos de luta pela moradia em Porto Alegre e no interior RS como, por exemplo, movimentos sociais, cooperativas habitacionais, associações comunitárias e de bairros.

A partir do ano de 2011 o CDES começou a atuar desde uma perspectiva nacional, elencando os temas dos conflitos territoriais urbanos, dos conflitos fundiários urbanos, da regularização fundiária e dos reassentamentos urbanos.

O Centro de Direitos Econômicos e Sociais participa em pesquisas e atividades do Observatório das Metrópoles – Núcleo Porto Alegre.

 

MEDIAÇÃO DE CONFLITOS FUNDIÁRIOS URBANOS NO BRASIL: COMO AVANÇAR EM DIREÇÃO AO DIREITO HUMANO À CIDADE?

Por Cristiano Müller

Nos últimos anos, o Brasil vem experimentando vários processos de mediação de conflitos fundiários urbanos. Via de regra, são experiências provocadas pelas próprias comunidades e indivíduos que estão na iminência de serem despejadas com uso de violência pelo Estado, representado ou por uma ordem judicial com uso de força policial, ou uma decisão administrativa cumprida de modo precário pelo próprio poder executivo.

São experiências, em sua maioria, visivelmente precárias que não guardam regulamentação própria, não tem princípios, diretrizes e ritmo regulado. São literalmente experimentações. Algumas levadas a efeito no interior dos poderes executivos municipais/estaduais ou no interior dos conselhos das cidades, do poder judiciário em grupos de mediação ou de conciliação, dos poderes legislativos nas suas comissões de direitos humanos e de moradia.

O resultado de tudo isso, foi a realização de mediações e acordos os mais variados possíveis. Casos de acordos que resultaram em remoções mediante o pagamento de aluguel social pelo poder público aos indivíduos removidos; casos de acordos financeiros que resultaram em pagamento de aluguéis pelos ocupantes ao proprietário privado; casos de acordos visivelmente opressores pendendo a balança contra os ocupantes que muitas vezes pagam valores absurdamente caros por uma área sem infraestrutura qualquer; casos em que não há proposta alguma do poder público e aí se consuma o despejo com violência policial agora legitimado por uma tentativa de acordo que não deu certo; casos também em que se conseguiu a posse provisória aos moradores até que o poder público garanta o direito à moradia pela via das políticas públicas existentes.

Por outro lado, há que se levar em conta que não é possível mais se admitir a realização de despejos. Não é possível mais se admitir a atuação do Estado Brasileiro contra toda a normativa internacional de direitos humanos que condenam essa prática dos despejos como sendo uma grave violação aos direitos humanos.

De uma vez por todas é hora de se compreender que um local da cidade que está ocupado significa que essa área não cumpria nenhuma função social e que os ocupantes não tinham direito à moradia digna garantido. Compreender que os conflitos fundiários urbanos são um grave problema social e que não serão resolvidos com os despejos e com violência policial.

Como se vê, esses processos de mediação vem dar algum tipo de resposta ao crescente número de despejos de comunidades e indivíduos pelo Brasil afora, seja para coordenar as ações necessárias para um despejo, seja para efetivamente mediar um conflito fundiário urbano. Chegou-se, portanto, a um verdadeiro dilema que tem a ver com a finalidade desses processos de mediação. São processos legitimadores do cumprimento de uma ordem de despejo ou são processos emancipadores de garantia de direitos fundamentais sociais? Esses processos atuam contra os despejos ou para ordenar um despejo? O que está no centro de um processo de mediação de conflitos fundiários urbanos, a dignidade humana ou a propriedade privada? Quem está no centro dos processos de mediação: as comunidades e as pessoas ou os imóveis públicos e privados ociosos e que não cumprem a sua função social?

A proposta desse pequeno artigo e reflexão é o de trazer alguma contribuição para o debate dos conflitos fundiários urbanos no Brasil, sempre tendo em mente que é preciso imediatamente se parar com os despejos e garantir dignidade humana para as pessoas e comunidades pobres ocupantes de um bem ocioso e que para eles não existe nenhuma política habitacional ou fundiária.

Experiências de mediação de conflitos fundiários no Brasil. / organizadores: Cristiano Müller e Karla Fabrícia Moroso Santos de Azevedo – Porto Alegre: CDES Direitos Humanos, 2017. 300 p.

O livro está disponível para download em: https://www.cdes.org.br/publicacoes

Publicado em Publicações | Última modificação em 07-12-2017 12:20:24