Conflitos, participação e alternativas para as cidades latino-americanas. Este foi o tema do debate promovido pelo Núcleo Porto Alegre do Observatório das Metrópoles na última quarta-feira, 27, e transmitido ao vivo no canal da rede no Youtube. A mesa, que reuniu observatórios e movimentos que trabalham e pesquisam temas urbanos na América Latina, fez parte da programação da 2ª edição do Fórum Social das Resistências (FSR), que iniciou na terça-feira, 26, e segue até dia 30 de abril, em Porto Alegre (RS). O principal objetivo da atividade foi debater os conflitos existentes nas cidades da América Latina, a participação dos movimentos e organizações sociais nas decisões sobre os planos, instrumentos e projetos de cidade e alternativas para as cidades latino-americanas.
“Pensamos nesta atividade a partir do contexto latino-americano, já que em Porto Alegre o núcleo impulsiona essa discussão, porque aqui nasceu o Fórum Social Mundial, em 2001. E como somos um núcleo do Observatório ao sul do Brasil em uma rede nacional, achamos importante realizar essa atividade aqui, para dar essa visibilidade ao sul e à América Latina”, ressaltou a coordenadora local, Vanessa Marx (UFRGS).
Além de Vanessa, a mesa contou com a participação de Paulo Soares (UFRGS), Marcelo Pérez (Observatorio de Conflictos Territoriales/Uruguai), Álex Paulsen Espinoza (Movimento Feman Ukamau/Chile), Jonatan Baldiviezo (Observatorio del Derecho a la Ciudad/Argentina) e Cristina Reynals (Aliança Internacional dos Habitantes – AIH).
Atividade do Fórum Social das Resistências de 2022
Na oportunidade, os convidados do Uruguai, Argentina e Chile, abordaram a realidade da conjuntura das lutas urbanas na América Latina, mais especificamente no Conesul. “Cada um desses convidados e convidadas trouxeram um pouco da situação do seu país, para fazermos um debate de uma construção de ideias, dentro da ideia das resistências urbanas pelo direito à cidade. Acredito que cada um desses países tenha as suas particularidades, problemas, questões que nos colocam, mas que também nos unem no ‘pensar as cidades’. Uma vez que são países cada vez mais metropolitanos, esses problemas urbanos que se colocam também acabam sendo uma questão política e de desenvolvimento nacional”, mencionou Paulo Soares.
Para o pesquisador, a situação brasileira vivida atualmente, num ano eleitoral, verifica-se desde 2016, visto que o país vive uma contrarreforma ultraliberal que está avançando e mercantilizando as cidades, eliminando direitos, entre eles, o direito às cidades. Ele pontuou que o governo está cerceando os canais democráticos, por exemplo, cancelando os conselhos democráticos de discussão das políticas públicas e que não apresentou nenhuma política pública para as cidades. “Isso permite, então, o avanço dos setores privados, como é o caso que estamos vendo em Porto Alegre, um intenso processo de mercantilização da cidade, de valorização urbana, de gentrificação e que afeta grande parte das populações”, apontou Soares.
Esta situação se reproduz nos países vizinhos, como por exemplo, no Chile, que vivencia a questão das lutas urbanas. A conjuntura do Chile, desde 2019, culminou em grandes lutas urbanas, com o processo constituinte e a redação de uma nova constituição que está chegando ao seu final e, também, com a eleição de um presidente que é oriundo desses movimentos de luta popular, urbana e social. Já o Uruguai passou recentemente por eleições que interromperam um ciclo de governo da centro-esquerda e que, posteriormente, o governo neoliberal que estava no Uruguai também estava tentando realizar uma série de reformas, como é o caso da Lei de Urgente Consideração, que foi objeto de um referendo recente, no qual ela foi confirmada, porém, houve uma intensa mobilização popular, e por muitos poucos votos a lei não foi revogada. “Esse processo de discussão da lei reacendeu muito das lutas urbanas e sociais no Uruguai”, explicou Soares.
E, por fim, a Argentina, que hoje tem um governo que não é ultraliberal, e sim, de centro-esquerda, mas que está passando por uma grande crise econômica, questionando muitas vezes essas medidas e a situação desse governo. As lutas locais e urbanas também estão bastante vinculadas às lutas nacionais que demandam dos movimentos uma visão nacional de projetos políticos de países hegemônicos, em determinado momento.
“Vimos que muitas das situações que cada um dos convidados colocou se repetem em diferentes países, então, mesmo que agora no Chile eles estejam em um momento bastante favorável da conjuntura, as metrópoles chilenas ainda não mudaram, o que mostra que ainda têm muitas tarefas pela frente. Nós, brasileiros, sabemos que muitas vezes os direitos escritos nas constituições não estão garantidos imediatamente, pois também são produtos de uma luta e são direitos que estão em disputa”, afirmou Soares. O vídeo da mesa está disponível na íntegra no canal do Observatório das Metrópoles no Youtube.