Segundo os dados do Censo 2010, nas 12 principais metrópoles brasileiras, mais de 13 milhões de pessoas se deslocam diariamente entre os municípios, seja para trabalhar ou estudar. Metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro não suportam mais deslocamentos baseados predominantemente no automóvel individual. O debate sobre a chamada crise de mobilidade ganha mais uma contribuição com o estudo lançado pelo Ipea em que analisa o tempo de deslocamento casa-trabalho no Brasil, no período que vai de1992 a 2009, a partir das diferenças entre regiões metropolitanas, níveis de renda e sexo. A pesquisa aponta, por exemplo, que trabalhadores de baixa renda no país fazem viagens, em média, 20% mais longas do que os mais ricos.
O INCT Observatório das Metrópoles também vem desenvolvendo estudos sobre mobilidade urbana no Brasil e, de modo mais específico, sobre o tempo de deslocamento casa-trabalho. Isso porque o tema tem papel central para o bem-estar da população que vive nas grandes cidades, e tem sido ponto central no entendimento sobre as formas de organização social e econômica do espaço urbano; relacionando-se ainda à decisão de localização de residências e empregos; e sendo apontado como indicador relevante para análises de desigualdade.
A chamada crise de mobilidade urbana é decorrente, sobretudo, da opção pelo transporte individual em detrimento das formas coletivas e da falta de planejamento do poder público. O artigo “Da Crise da mobilidade ao apagão urbano” mostra que a realidade vivida na maioria das 15 metrópoles brasileiras é de aumento do número de automóveis em 66% entre 2001 e 2010, enquanto a população cresceu por volta de 10,7%. O resultado é que um maior número de pessoas leva mais tempo em seus deslocamentos cotidianos. Uma verdadeira via-crúcis: com o enfrentamento de longas distâncias, engarrafamentos e as constantes panes do sistema público de transporte.
Na região metropolitana de Belo Horizonte, por exemplo, o percentual de pessoas que levavam mais de uma hora no trajeto casa trabalho passou de 13,5%, em 2001, para 16,5%, em 2008. Em São Paulo, o recorde de congestionamento, que foi batido por duas vezes no mesmo dia em 2009, chegou a 294 km. Para aqueles que utilizam o transporte público, entre todas essas dificuldades, soma-se ainda o alto preço das tarifas, complicador maior no caso de mercados de trabalhos organizados na escala metropolitana e que exigem deslocamentos cada vez mais distantes, baldeações e trocas intermunicipais.
Relatório Frota de automóveis e motocicletas (2001/2011)
O Observatório publicou em 2012 o relatório “Metrópoles em números: Crescimento da frota de automóveis e motocicletas nas metrópoles brasileiras 2001/2011”, organizado pelo pesquisador Juciano Martins Rodrigues a partir das informações fornecidas pelo DENATRAN. O trabalho aponta a explosão do número de automóveis e motocicletas nas metrópoles brasileiras. Entre 2001 e 2011, o número de automóveis nas 12 metrópoles aumentou de 11,5 milhões para 20,5 milhões. Já as motocicletas passaram de 4,5 milhões para 18,3 milhões nestes mesmos dez anos.
Em 2011 o número de automóveis nas metrópoles brasileiras chegou a atingir a marca de 20.525.124 veículos. Este número representa aproximadamente 44% de toda a frota brasileira. Nessas metrópoles, entre 2001 e 2011, houve um aumento de mais de 8,9 milhões de automóveis, aproximadamente 77,8%. Em média, foram adicionados mais de 890 mil veículos por ano.
Mobilidade, território e desigualdade
Outra contribuição importante do Observatório das Metrópoles relaciona o território, a mobilidade urbana e a oportunidades de trabalho. A tese “Educação, estrutura social e segmentação residencial do território metropolitano”, do pesquisador Marcelo Gomes Ribeiro, é uma investigação original que relaciona a escolaridade e o trabalho com a segmentação do território nas regiões metropolitanas do Brasil.
Ao considerar o padrão “centro-periferia” para compreender as diferenças de rendimentos dos indivíduos, o estudo sugere que os moradores das periferias estão em desvantagens na busca por ocupações que apresentam maiores remunerações decorrente das dificuldades referente à mobilidade urbana em contextos metropolitanos associados à capacidade de inserção em redes sociais (capital social) que possibilitam o acesso às melhores ocupações, haja vista que os melhores empregos tendem a se concentrarem no núcleo metropolitano, próximos dos indivíduos que aí residem.
Relatório Ipea: Tempo de descolamento casa-trabalho no Brasil (1992-2009)
O estudo “Tempo de deslocamento casa-trabalho no Brasil (1992-2009): diferenças entre regiões metropolitanas, níveis de renda e sexo”, que acaba de ser lançado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), tem como objetivo analisar o tempo que a população gasta em deslocamentos urbanos casa-trabalho no Brasil no período compreendido entre 1992 e 2009. A análise enfatiza as diferenças encontradas entre as nove maiores regiões metropolitanas (RMs) do país mais o Distrito Federal (DF), além de destacar como estas diferenças variam de acordo com níveis de renda e sexo.
O estudo se baseia nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domícilios (PNAD), gerados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), uma fonte de dados até hoje pouco explorada em estudos sobre transporte urbano no Brasil. A PNAD não é uma pesquisa desenhada com o propósito de investigar a fundo o tema do transporte urbano; no entanto, esta é a única pesquisa amostral de larga escala feita no país com informações sobre o tempo de deslocamento casa-trabalho disponíveis anualmente – desde 1992 – tanto para o nível nacional quanto para o subnacional (estados e regiões metropolitanas).
Do estudo destacam-se cinco principais resultados: i) o tempo de deslocamento casa-trabalho, que no ano de 2009 era 31% maior nas RMs de São Paulo e Rio de Janeiro se comparado às demais RMs; ii) os trabalhadores de baixa renda (1o decil de renda) fazem viagens, em média, 20% mais longas do que os mais ricos (10o decil), e 19% dos mais pobres gastam mais de uma hora de viagem contra apenas 11% dos mais ricos; iii) esta diferença de tempo de viagem entre ricos e pobres varia entre as RMs, sendo muito maior em Belo Horizonte, Curitiba e no DF, e quase nula em Salvador, Recife, Fortaleza e Belém; iv) os dados apontam para uma tendência de piora nas condições de transporte urbano desde 1992, aumentando os tempos de deslocamento casa-trabalho; no entanto, esta piora tem sido mais intensa entre as pessoas do 1º decil de renda e especialmente entre a população mais rica (entre 7oe 10o decil), diminuindo as diferenças de tempo de viagem entre faixas de renda no período analisado; e v) a diferença do tempo médio gasto nos deslocamentos casa-trabalho entre homens e mulheres diminuiu consideravelmente desde 1992, com pequenas diferenças ainda presentes nos grupos extremos de renda.
Pode-se observar na pesquisa realizada pelo Ipea que as tendências observadas no Brasil não seguem necessariamente aquelas observadas em países desenvolvidos. Destaca-se também que análises que se concentram nas tendências nacionais tendem a ocultar importantes diferenças regionais. Sob uma perspectiva de política pública, este texto aponta o potencial de utilização dos dados da PNAD para o monitoramento das condições de mobilidade nas principais regiões metropolitanas do Brasil, uma vez que as variações anuais nos tempos de viagem casa-trabalho podem contribuir para a avaliação dos efeitos de determinadas políticas e investimentos sobre as condições de transporte.
Para ler o estudo completo do Ipea sobre deslocamento casa-trabalho, clique aqui.
Última modificação em 07-03-2013