Neste artigo José Luís Fiori analisa as causas da desaceleração das economias de Colômbia, Peru e Chile – e como esses países dispõem de poucas alternativas para retomar o crescimento no curto prazo, já que só conseguem operar com eficiência atrelados a algum aparelho econômico que seja mais amplo e complexo.
O artigo “Colômbia, Peru e Chile” foi cedido pelo cientista político José Luís Fiori para o INCT Observatório das Metrópoles com o propósito de contribuir para o debate sobre o Neoliberalismo e o sistema de poder hegemônico mundial. Fiori é coordenador do Programa de Pós-Graduação em Economia Política Internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e autor do livro “O Poder Global” (Editora Boitempo). Ele pesquisa e ensina há mais de 20 anos no campo das Relações Internacionais, e em particular, na área de Economia Política Internacional, com ênfase no estudo das relações entre a geopolítica e a economia política do “sistema inter-estatal capitalista”.
Até 2008, publicou 9 livros e organizou 5 coletâneas. Ganhou o Premio Jabuti de Economia, Administração, Negócios e Direito, na Bienal do Livro de São Paulo, em 1998, com o livro “Poder e Dinheiro. Uma economia Política da Globalização”, organizado com a professora M.C.Tavares; e recebeu Menção Honrosa, na Bienal do Livro de 2002, com o livro “Polarização Mundial e Crescimento”, organizado com o professor C. Medeiros. Desde 1990, publicou cerca de 230 artigos em jornais como Valor Econômico, Correio Braziliense, Folha de São Paulo, Jornal do Brasil, Jornal do Comercio, e em revistas como Carta Capital, Exame, Praga, Margem Esquerda, Carta Maior, SinPermisso e La Onda.
COLÔMBIA, PERU E CHILE
JOSÉ LUÍS FIORI
A projeção de crescimento do PIB da Colômbia, Peru e Chile, para 2014, já foi revista para baixo, várias vezes, neste primeiro semestre do ano. Junto com a previsão de queda – cada vez maior – dos investimentos privados, e de subida simultânea da taxa de inflação, nos três países. No caso da Colômbia, depois de quatro anos de crescimento médio de 5%, a tendência atual aponta para uma taxa inferior a 4%. A Associação Nacional de Instituições Financeiras (ANIF) da Colômbia considera que o ciclo recente de crescimento do país acabou e foi um caso típico de “voo da galinha”, puxado pelas vendas externas que agora estão em queda (só para os EUA caíram 15% em 2013); pela indústria que está em retração (já caiu para 12% do PIB); e pela agricultura que se sente sem condições de concorrer, depois da abertura comercial do país, dos últimos anos.
Um panorama econômico que fica ainda mais complicado quando se tem presente que mais de 40% da população colombiana já se encontrava abaixo da linha da pobreza, em pleno período de alto crescimento do país, segundo o Escritório do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos. Daí o pessimismo dos investidores privados e a sua resistência frente ao grande plano de obras do governo colombiano – no valor de U$ 25 bilhões – desenhado para desbloquear a infraestrutura de transportes e comunicação da Colômbia, que é péssima.
No caso do Peru, as taxas de crescimento do ciclo recente foram ainda mais elevadas (uma média de cerca d 7%) e por isto a perspectiva de queda em 2014 é relativamente maior. O ex-ministro da Fazenda Pedro Pablo Kuczynski, do Peru, prevê uma taxa de 4% ou talvez menos, e antecipa uma grande queda no investimento privado durante este ano provocada pelas expectativas pessimistas do empresariado, e pela consequente perda de posições do país junto aos investidores internacionais.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística e Informática (INEI) do Peru, a produção industrial vem caindo regularmente, e de forma ainda mais acentuada no caso da produção mineira que é a maior atividade econômica do país. As suas exportações também estão caindo, o déficit comercial está aumentando, e neste momento existem nada menos que 30 projetos petroleiros interrompidos, por falta de recursos e de investidores interessados.
Por fim, o Chile também teve um crescimento médio de quase 6%, nos últimos 4 anos, mas a previsão de crescimento para 2014 já foi reduzida em 1/3, e pode ficar abaixo dos 3%, depois de um primeiro trimestre em que o seu PIB teve seu menor crescimento e a inflação o seu maior aumento nos últimos 4 anos. Neste mesmo trimestre, os investimentos tiveram uma queda de 5%, depois de já terem caído 12,3% no último trimestre de 2013, enquanto a produção industrial registrava uma contração, em 8 dos últimos 12 meses. Por fim, o preço internacional do cobre alcançou seu nível mais baixo dos últimos 4 anos, interrompendo o boom de investimento na indústria mineradora desta última década.
Esta desaceleração da economia foi uma das grandes responsáveis pelo pessimismo empresarial, e pela insatisfação social que derrotou no Chile, o governo conservador de Sebastian Piñera, e elegeu – em 2103 – a presidenta socialista Michele Bachelet; que dificultou imensamente a reeleição do presidente colombiano, Juan M. Santos da Colômbia, que só foi lograda com o apoio das forças de esquerda; e que mantém o presidente peruano, Ollanta Humala, prisioneiro de um baixíssimo nível de aprovação popular – de apenas 22% – e quase sem perspectiva de eleger seu próprio sucessor.
Como consequência, se discute cada vez mais – no meio político e acadêmico dos três países – novos caminhos e alternativas capazes de recolocá-los na rota de crescimento dos últimos anos. O presidente reeleito da Colômbia defende a necessidade de uma política industrial e de defesa da produção agrícola nacional; a nova presidente do Chile já propôs uma ampla reforma fiscal para refortalecer o estado chileno, e vem defendendo junto com o presidente colombiano, um estreitamento de laços com os países do Mercosul.
O problema é que a maior dificuldade para mudar está nas próprias limitações objetivas destes três países andinos. Em primeiro lugar, eles possuem territórios de difícil ocupação e exploração econômica, e com terras pouco férteis, com exceção do vale central do Chile. Em segundo lugar, os três países possuem economias nacionais muito pequenas, que são praticamente “mono-exportadoras” de commodities, sem escala nem fôlego para construir um sistema industrial próprio, e apoiado na dinâmica do seu mercado interno.
No caso da Colômbia, os combustíveis minerais são responsáveis por 66% de sua pauta de exportações; no caso do Peru, os minérios e combustíveis minerais constituem 63%; e no caso do Chile o cobre e alguns outros minérios representam cerca de 60% de suas exportações. Sendo que o Chile ainda tem o agravante de ser uma economia inteiramente vulnerável do ponto de vista energético, dependendo da importação de energia elétrica e de combustíveis para atender a todas as suas necessidades nacionais.
Em síntese, frente à desaceleração do seu crescimento, e ao aumento das insatisfações sociais, a Colômbia, o Peru e o Chile dispõem de muito poucas alternativas econômicas, no curto prazo. Se transformaram em economias que só conseguem operar com eficiência, e durante períodos limitados de tempo, como “fusíveis” de algum “aparelho econômico” que seja mais amplo e complexo, mas que escapa inteiramente ao seu controle.