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A pesquisa “Cartografias Jurídicas: Mapeando Conflitos Fundiários na Cidade do Rio de Janeiro” acaba de atualizar o Panorama de Conflitos Fundiários Urbanos. Os dados mais recentes referem-se aos casos em curso em 2023 e mostram que mais de 13 mil famílias sofrem com ameaças de remoção na cidade do Rio de Janeiro.

A iniciativa nacional de produção do “Panorama dos Conflitos Fundiários Urbanos” levanta dados sobre este fenômeno desde 2018 em diversas capitais do país, revelando a sua extensão e gravidade. O projeto “Cartografias Jurídicas” contribui com esse esforço nacional produzindo e analisando dados sobre os conflitos fundiários na cidade do Rio de Janeiro, sendo coordenado pelo Labá – Direito, Espaço & Política, em parceria com o INCT Observatório das Metrópoles Núcleo Rio de Janeiro, ambos sediados na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O projeto tem como fonte primordial de seus dados o Núcleo de Terras e Habitação (NUTH) da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, que atende a casos administrativos e jurisdicionais envolvendo ameaças à segurança da posse que afetem grupos formados por mais de 10 famílias de baixa renda; tratando-se de conflitos fundiários coletivos.

As disputas por terra são um marco das cidades brasileiras, colocando em ameaça o direito à dignidade, à moradia e a vida de milhares de famílias. O novo ciclo de atualização da pesquisa traz dados inéditos e confirma tendências históricas que colaboram para a compreensão da atual situação de insegurança da posse e desigualdade socioespacial no Rio de Janeiro.

Dados em destaque sobre o Rio de Janeiro

A pesquisa identificou 150 casos de conflitos fundiários na cidade do Rio de Janeiro, atingindo 13.544 famílias (aproximadamente 50 mil pessoas). A maior parte dos casos são ameaças de remoção, mas também foram mapeados 3 casos de remoções efetivadas em 2023 e 5 casos de remoção evitada nesse mesmo ano.

Em relação aos agentes promotores das ameaças, a pesquisa revela que o setor privado concentra a maior parte dos casos de conflito, mobilizando majoritariamente o argumento de violação da propriedade dos imóveis utilizados como moradia. São 84 casos de ameaça de remoção provocados por agentes privados, afetando 6.087 pessoas.

Gráfico 1: Famílias ameaçadas de remoção quanto à esfera do autor da ameaça. Fonte: Labá, 2024.

Embora responsável por um número menor de casos, contabilizando 58 ameaças de remoção, o poder público atinge o maior número de famílias, afetando 7.252. Nesse recorte, o poder público em sua esfera municipal tem protagonismo, atuando em 36 casos e colocando sob risco de remoção 4.729 famílias.

Os dados também reforçam que as favelas continuam sendo o maior alvo dos conflitos fundiários, sendo objeto de 62% das ameaças de remoção promovidas pela esfera municipal. Importante registrar que as favelas são o local de moradia de cerca de 20% da população da cidade do Rio de Janeiro e esses dados destacam a permanente vulnerabilidade destes territórios em relação à segurança da posse da terra.

Gráfico 2: Casos de ameaça de remoção por agente promotor da ameaça e formas de morar. Fonte: Labá, 2024.

Ainda no âmbito da atuação municipal, o levantamento aponta que são dois os principais motivos alegados para promover as remoções:

  • Vulnerabilidade ambiental e alegação de risco: afetando 2.417 famílias em 15 casos;
  • Irregularidade urbanística: afetando 1.425 famílias em 10 casos.

Gráfico 3: Motivos alegados pela esfera municipal em número de famílias ameaçadas. Fonte: Labá, 2024.

O trabalho de georreferenciamento das informações mostra uma atuação do poder público concentrada em áreas ocupadas pela população de mais alta renda e sob a qual recai grande interesse do mercado imobiliário carioca que correspondem a bairros litorâneos da Zona Sul, Barra da Tijuca, Recreio e Jacarepaguá. Portanto, ainda que os motivos alegados não explicitem tais dinâmicas, a localização dessas ameaças indicam uma prevalência dos interesses privados em detrimento da efetivação de direitos garantidos, como o direito à moradia digna e o princípio da não remoção.

Por fim, ressaltamos que entre os 142 casos de ameaça de remoção identificados na pesquisa, 94 tiveram início entre os anos de 2009 e 2024, afetando 7.297 famílias. Esses dados evidenciam a intensificação dos conflitos ao longo desse período.

Mais alarmante ainda é que 43 casos tiveram início antes de 2008, fazendo com que 5.547 famílias estejam sob constante ameaça de remoção há mais de 15 anos, sem que tenham sido solucionadas suas necessidades habitacionais ou superada essa condição de precarização da moradia e da vida.

As informações produzidas pela pesquisa explicitam a influência do Estado e do Direito na formação do espaço urbano, lançando luz para as disputas de interesse que moldam a vida na cidade e a efetivação dos direitos dos cidadãos.

Mapa 1: Casos de Ameaça de Remoção no Município do Rio de Janeiro (2023). Fonte: Labá, 2024.

Mapa 2: Casos de Ameaça de Remoção Promovidos pelo Município (2023). Fonte: Labá, 2024.

Em período eleição municipal, fica ainda mais evidente a importância de disputar pela cidade que queremos, que seja pensada por e para as pessoas que nela vivem.


Com informações do Labá – Direito, Espaço & Política: www.laba-ufrj.com. Mais informações sobre a pesquisa: laba.direitoep@gmail.com