O INCT Observatório das Metrópoles participa, como entidade parceira do Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU), da Cúpula dos Povos e da Rio+20, no período de 13 a 22 de junho, com o objetivo de promover o debate e chamar a atenção das autoridades públicas, da sociedade civil e das organizações nacionais e internacionais sobre o tema da sustentabilidade urbana e da inclusão social. Num contexto de crescimento acelerado da população urbana mundial, que pode chegar a 70% em 2050 morando em cidades, é fundamental articular o tema do desenvolvimento sustentável com a questão urbano-metropolitana e seus impactos socioambientais, além de elaborar uma agenda de compromissos por cidades efetivamente sustentáveis e inclusivas.
O modelo de crescimento urbano que vigora na maior parte dos países com acelerado crescimento, como o Brasil, é insustentável do ponto de vista socioambiental. E está marcado por processos urbanos e econômicos como apropriação privada da terra e remoção forçada de populações, especulação imobiliária, altas densidades com ocupação horizontal nos assentamentos humanos precários, acentuada desigualdade socioterritorial, e priorização do automóvel – elementos que provocam fortes impactos ambientais.
Esses processos criam graves consequências para a qualidade de vida humana nas cidades, como ausência de esgotamento sanitário e poluição dos cursos de água; destinação final de resíduos sólidos em lixões; contaminação do solo; carência de espaços públicos; depredação de áreas verdes e violação da proteção permanente aos cursos de água e nascentes; contaminação do ar e a inevitável repetição de desastres naturais de diferentes tipos.
Para o Observatório das Metrópoles, que vem desenvolvendo pesquisas há mais de 15 anos sobre as diversas dimensões relacionadas às temáticas urbana e metropolitana – como a moradia, a mobilidade urbana, a segurança, o planejamento e regulação urbana, o meio ambiente, os aspectos socioeconômicos do espaço urbano, a governança metropolitana, as correlações entre educação e território, saúde e território, bem como as mudanças demográficas ocorridas no Brasil nas últimas décadas -, a realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) é uma oportunidade única para promover o debate sobre a sustentabilidade urbana e, nos espaços democráticos da Cúpula dos Povos, articular com movimentos sociais uma agenda comum de compromissos para que o Brasil e os outros países possam, no futuro, construir cidades mais sustentáveis.
Plataforma por Território Justos, Democráticos e Sustentáveis
Uma das ações de destaque durante a Rio+20 e Cúpula dos Povos será o lançamento da Plataforma por Territórios Justos, Democráticos e Sustentáveis, promovida pelo Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU), a Habitat International Coalition (HIC) e a Internacional de los Habitantes (AIH) com o objetivo de defender o direito à cidade, a reforma urbana e a reforma agrária como mudança de paradigma para o planeta.
Dentre as entidades filiadas ao Fórum Nacional de Reforma Urbana que irão participar da Cúpula dos Povos e da Rio+20, além do Observatório das Metrópoles, destaque para União Nacional por Moradia Popular (UNMP), Central de Movimentos Populares (CMP), Assembleia dos Povos, Mobilização Global, Instituto Polis, Federação Nacional dos Urbanitários (FNU/CUT), Observatório da Mulher, Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa e Olimpíadas, Frente Nacional de Saneamento Ambiental (FNSA), Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (ASSEMAE), Confederação Nacional das Associações de Moradores (CONAM), Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB).
A Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa e Olimpíadas promove, no dia 18 de junho, o debate na Cúpula dos Povos com o tema “Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos”, com o objetivo de chamar a atenção das autoridades públicas, da sociedade brasileira, das organizações de defesa dos direitos humanos no Brasil e no exterior, para o verdadeiro legado dos megaventos esportivos que serão realizados no Brasil – Copa do Mundo 2014 e Olimpíadas 2016.
Segundo Marcelo Edmundo, da Central dos Movimentos Populares (CMP) e membro dos Comitês Populares da Copa, o espaço do debate visa apresentar as denúncias de violação do direito à moradia e falar do desrespeito, por parte das autoridades, do direito de cidadãos e cidadãs de terem acesso à informação e a participar dos processos decisórios nos preparativos dos megaeventos no Brasil. “O que temos visto até agora é a subordinação dos interesses públicos aos interesses de entidades privadas, o desrespeito sistemático à legislação urbana e aos direitos ambientais, o desperdício dos recursos públicos e a falta de transparência no uso desses recursos”, argumenta.
O INCT Observatório das Metrópoles tem realizado o projeto de pesquisa “Metropolização e Megaeventos”, com o objetivo de elaborar e aplicar instrumentos de monitoramento dos impactos relacionados à Copa do Mundo de 2014 e aos Jogos Olímpicos de 2016 na estrutura urbano-metropolitana onde serão realizados estes eventos. Nesse sentido, o projeto pretende elaborar uma metodologia e indicadores, baseados na experiência acumulada pelo instituto e utilizando a rede de instituições e pesquisadores já existente, constituída há 17 anos, envolvendo 97 principais pesquisadores e 59 instituições universitárias de pós-graduação, ONG´s e centros estaduais de pesquisa. Visa-se, com isso, permitir ao poder público um maior poder de decisão a partir dos estudos e indicadores produzidos, de forma a se maximizar os benefícios e minimizar os custos sociais resultantes dos eventos, além de desenvolver instrumental teórico e metodologia que possam ser aplicados a outros casos similares.
Para o coordenador nacional do Observatório das Metrópoles, Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro, participar da Cúpula dos Povos e da Rio+20 é uma grande oportunidade para debater o conceito de sustentabilidade e desenvolvimento vigentes hoje, sobretudo incluindo a dimensão das cidades e o seu papel hoje. “A questão da sustentabilidade urbana deveria ocupar, na Rio+20, um papel de grande centralidade e protagonismo, já que seu caráter transversal articula meio ambiente com a inclusão social e o desenvolvimento econômico”, afirma.
Leia:
Projeto Metropolização e Megaeventos
Rio olímpico e mobilidade urbana: qual será o legado?
O Fórum Nacional de Reforma Urbana, a Habitat International Coalition (HIC) e a Internacional de los Habitantes (AIH) elaboraram uma carta/chamado para a Cúpula dos Povos e Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20). Com o título “O direito à cidade – reforma urbana e reforma agrária como mudança de paradigma” apresenta a posição das organizações, uma lista de compromissos pela mudança de paradigma e um convite à participação e convergência.
Leia a seguir o texto.
O direito à cidade reforma urbana e reforma agrária como mudança de paradigma
Nós, organizações e redes internacionais de habitantes pela reforma urbana e pelos direitos ao hábitat, , participaremos da Cúpula dos Povos, contra a mercantilização da vida e da natureza, em defesa dos bens comuns, que se realizará no Rio de Janeiro, Brasil, do dia 15 a 23 de junho de 2012, perante a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20).
Fazemos este chamado para que este espaço seja um marco no processo de consolidação do diálogo e das alianças na definição de uma plataforma e um programa de ação comum entre os movimentos de habitantes do campo e da cidade, e de todas as organizações que lutam por territórios justos, democráticos e sustentáveis.
Construamos este diálogo para dar-lhe prosseguimento em novos espaços, tais como o Fórum Urbano Mundial 6, Fórum Social Urbano 2 (Nápoles, setembro 2012) e Fórum Social Mundial – Assembleia Mundial dos Habitantes (Tunísia, março ou abril 2013).
As cidades e o direito de resistir ao modelo neoliberal que provocou a crise
Começamos o novo milênio com a metade da população vivendo em cidades, e a taxa de urbanização continuará crescendo. As cidades são territórios potenciais de grande riqueza e diversidade econômica, ambiental, política e cultural. Contudo, o modelo neoliberal, implementado praticamente em todo o mundo, concentra renda e poder nas mãos das elites; os processos de urbanização acelerada contribuem para a depredação do meio ambiente e a privatização do espaço público, causando empobrecimento, exclusão e segregação social e espacial. Este é o modelo que levou à crise financeira global que está acirrando os problemas relativos à moradia, no campo e na cidade.
A grande maioria dos habitantes das cidades sofre os ataques deste modelo e suas repetidas crises, estando privada ou limitada na satisfação de suas necessidades básicas e, portanto, tem direito e a legitimidade de resistir às violações em seus direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais.
Desde a primeira Cúpula da Terra no Rio de Janeiro (ECO 92), movimentos populares, organizações sociais, associações profissionais, fóruns e redes nacionais e internacionais da sociedade civil assumiram o desafio de construir um modelo de sociedade e de vida urbana sustentável, baseado nos princípios de solidariedade, liberdade, igualdade, dignidade e justiça social.
A Carta Mundial pelo Direito à Cidade: plataforma comum para exigirmos nossos direitos e defender os bens comuns
Um resultado desta mobilização internacional dos setores da sociedade civil a partir do Fórum Social Mundial em Porto Alegre em 2001 foi a elaboração e difusão da Carta Mundial pelo Direito à Cidade, que propõe uma plataforma por cidades justas, democráticas, mais humanas e sustentáveis.
Sabendo que a construção de uma cidade justa e igualitária é inseparável das lutas pelo pleno usufruto social, equitativo e sustentável dos bens comuns, como a água, a flora e a fauna, pela democratização do acesso à terra urbana e rural, pela reforma urbana y reforma agrária, pela democratização da gestão do território, pela soberania alimentar dos povos, pelas práticas agrícolas ambientalmente sustentáveis, pela garantia dos modos e meios de vidas dos agricultores e agricultoras familiares e das populações tradicionais e indígenas em todo o mundo, agora em 2012, frente aos governos, ao G20 e às instituições financeiras internacionais, com nossas lutas e nossas capacidades, voltamos a exigir as condições necessárias, em particular as políticas públicas, para a vida em harmonia, paz e felicidade em territórios justos e sustentáveis.
A partir da declaração do Rio aprovada pelo Fórum Urbano Mundial da ONU-Habitat em 2010, “o Direito à Cidade é compreendido como um direito coletivo das gerações presentes e futuras para uma cidade sustentável sem discriminação de sexo, idade, raça, estado de saúde, renda, nacionalidade, origem étnica, migração, orientação política, violência sexual e religiosa, assim como a preservar usa identidade e memória cultural”, é hora de os Estados e a sociedade civil, juntos, apresentarmos obrigações e responsabilidades para com novos pactos sociais e territoriais fundamentados em paradigmas alternativos ao neoliberal, assumindo os seguintes compromissos:
1. O exercício pleno da cidadania. Uma cidade em que todas as pessoas (crianças, jovens, adultos, idosos, mulheres e homens, que vivem de forma permanentemente transitória nas cidades) realizam e desfrutam de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, mediante a construção de condições de bem-estar coletivo com dignidade, equidade e justiça social. Para este fim e para garantir o direito à cidade os seus habitantes, atores sociais e instituições devem poder exercer sua autonomia para resistir à agressividade da globalização neoliberal, sem sofrer a criminalizações de suas expressões cívicas.
2. A função social da cidade, da terra e da propriedade. Uma cidade onde seus habitantes participam para que a distribuição do território e a regulação de seu uso garantam o usufruto equitativo dos bens, serviços e oportunidades que a cidade oferece. Uma cidade em que se priorize o interesse público definido coletivamente, garantindo um uso socialmente justo e ambientalmente equilibrado do território. Portanto, devem-se gerar e implementar políticas públicas e instrumentos específicos para frear a especulação, a segregação urbana, a exclusão, os despejos e deslocamentos, e a concentração da terra urbana e rural.
3. A gestão democrática da cidade. Uma cidade onde seus habitantes participem de todos os espaços de decisão – até o mais alto nível – para a formulação e implementação das políticas públicas, assim como no planejamento, orçamento público e o controle dos processos urbanos. Trata-se de fortalecer os espaços institucionalizados de tomada de decisão e não apenas como os espaços consultivos – com participação na gestão, monitoramento e avaliação das políticas públicas.
4. A produção democrática da cidade e na cidade. Uma cidade onde se resgata e se fortalece a capacidade produtiva de seus habitantes, em especial dos setores populares, fomentando e apoiando a produção social do habitat e o desenvolvimento das atividades econômicas solidárias, incluindo a agricultura urbana para fortalecer a soberania alimentar. O direito a produzir a cidade e a um habitat produtivo, incluindo o direito à energia, que gerem renda para todas e todos, que fortaleça a economia popular e não só as ganâncias quase monopólicas de uns poucos. Uma cidade aberta e alerta às necessidades dos grupos vulneráveis, das pessoas em situação de pobreza e de risco ambiental (ameaçadas e/ou vítimas de desastres ambientais gerados pelo ser humano), das pessoas ameaçadas e/ou vítimas de violência, das pessoas com deficiências, dos imigrantes e refugiados, e de todos os setores que estão marginalizados ou em desvantagem com respeito aos demais habitantes.
5. O manejo sustentável e a responsabilidade sobre os bens comuns naturais, patrimoniais e energéticos da cidade e seu entorno. Uma cidade onde seus habitantes e autoridades implementam políticas públicas para uma relação responsável dos bens comuns como a água e o meio ambiente – sem privatização -, para assegurar a vida digna das pessoas, das comunidades e povos, em igualdade de condições e sem afetar as áreas naturais de reserva ecológica; para a presente e para as futuras gerações.
6. O usufruto democrático e equitativo da cidade. Uma cidade que reconhece o direito ao acesso à igualdade e às oportunidades, favorecendo uma convivência social, promovendo a equidade de gênero, respeitando todas as pessoas, independentemente de sua etnia, idade, capacidades, orientação sexual e religião. Uma cidade que facilita a mobilidade de todos os seus habitantes, com tecnologia sustentável não poluidora e incentivos ao transporte público e a meios alternativos – como a bicicleta – para todas e todos. Uma cidade que inclui, na formação escolar, universitária e dos funcionários públicos responsáveis pelas políticas locais, o direito à cidade sustentável e o direito à comunicação horizontal e à informação.
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