Uma grande obra está sendo realizada em Maringá (PR) com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Chamada de Contorno Norte, a intervenção tem como objetivo mudar o fluxo da BR 369 retirando-o do centro da cidade, e é considerada fundamental para o contexto viário local e regional de acordo com as autoridades. No entanto, a obra se configura como uma trincheira no tecido urbano, e impacta profundamente a vida cotidiana dos moradores do entorno da via e aprofunda a histórica constituição do espaço urbano maringaense de segregação social.
Realizada pelo núcleo Maringá, vinculado à rede INCT Observatório das Metrópoles, no segundo semestre de 2011, a pesquisa toma como pressuposto que a produção das cidades se dá através de complexos processos que impactam diretamente a vida da população; os levantamentos e análises realizados nessa oportunidade se detêm sobre a constituição e reprodução do espaço urbano de Maringá no contexto das obras do PAC-Contorno Norte de Maringá, buscando compreender, investigar e analisar os impactos da implantação de uma obra viária que consolida um complexo de viadutos e trincheiras que, de alguma forma, interferem na vida cotidiana dos moradores dos arredores. Portanto, uma obra pública que, apesar de não finalizada, já trouxe reflexos irreversíveis para toda a população de seu entorno, bem como para toda a região.
O objeto dessa pesquisa será analisado não apenas como uma obra arquitetônica, mas no que esta se relaciona diretamente à vida dos moradores do entorno da obra que, apesar de ter por objetivo oficial a melhoria do tráfego nas principais avenidas da cidade, trouxe diversos impactos negativos para a vida cotidiana principalmente para a população do entorno próximo, como os dados mostrarão.
De acordo com a Prefeitura Municipal e com órgãos competentes, esta via seria capaz de absorver boa parte dos veículos que trafegavam nas passagens de acesso à cidade: “A implantação do Contorno Norte de Maringá é obra de fundamental importância para o contexto viário local e regional, uma vez que atenderá ao tráfego de longa distância. Essa obra vai garantir maior fluidez e, em conseqüência, retira da Avenida Colombo o tráfego pesado, melhorando as condições de circulação”, explica o superintendente do DNIT, no Paraná, José da Silva Tiago (www.maringa.pr.gov.br, consulta em 02/10/2010).
A obra é executada pela empreiteira Sanches Tripoloni, seguindo a pauta do Ministério do Planejamento que liberou recursos para o município por meio do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC). Durante sua construção, o contorno causou – e continua causando – transtornos à população que vive às margens imediatas da obra. Porém, segundo representantes dos órgãos oficiais, para além da melhoria do trânsito na região central da cidade e da economia local, a rodovia também traria benefícios para os bairros onde a via está sendo construída. Nesse sentido, tais investimentos feitos em infra-estrutura trariam mais eficiência e organização para a cidade, que já é referência como pólo educacional, industrial e de agronegócios. Mas, salienta-se, não é o que a população residente nas áreas de influência da via avalia, conforme se demonstrará nos dados ora apresentados.
Ao contrário, a construção do Contorno Norte origina uma série de problemas para os moradores do bairro, dentre os quais se destacam: i) o bairro foi dividido pela obra construída em duas partes, causando dificuldades de comunicação e problemas para os comerciantes que observam a redução de seus clientes; ii) a obra causa dificuldades de acesso de um lado para o outro, pois possui poucas passarelas e os moradores reclamam da falta de segurança das mesmas; iii) o Contorno causa problemas de segurança, pois a sinalização das vias é deficiente e de pistas duplas se afunilam para pista única nos viadutos, onde já ocorrerem nos últimos dois anos mais de uma dezena de acidentes com 3 mortes e iv) a obra foi realizada sem o total consentimento dos moradores, que não tiveram a oportunidade de se expressar e de opinar acerca dos problemas que a obra poderia causar para eles.
A maioria dos entrevistados afirmou que a não houve nenhuma participação da comunidade nas decisões para a construção da obra. Outros fatores negativos foram ainda apontados com bastante freqüência pelos moradores da região: o barulho, a poeira, a dificuldade de locomoção e deslocamento, rachaduras em suas casas, falta de visibilidade de outras regiões da cidade e desvalorização imobiliária, como se observa na apresentação dos resultados.
A obra foi edificada sobre uma área urbana de Maringá que já possuía uma ocupação constituída de 9074 domicílios com uma população de 30 mil moradores, apenas nos setores censitários cortados pela mesma. O acesso da população moradora na parte externa da via ficou bastante comprometido, pois são escassas as áreas de passagem. Em toda a extensão há apenas 07 passarelas para pedestres e 13 viadutos para automóveis, ainda não implantados na sua totalidade.
A construção do Contorno Norte ao invés de contornar a cidade de Maringá, como o objetivo principal almejava, passa por dentro do município, separando diversos bairros, constituindo o que os moradores estão chamando o lado de “cá” e o lado de “lá” do contorno. Esta clara separação dentro da cidade dá lugar ao lado de “lá” constituído pela parte externa da via que se caracteriza por um espaço urbano precário, pois destituído dos equipamentos urbanos e sociais básicos e, portanto, passível de estigmas de toda ordem.
Leia o trabalho completo “PAC Maringá Contorno Norte: aprofundando o processo de segregação socioespacial” aqui.
Redigido por Breno Procópio, Assessor de Comunicação da Rede INCT Observatório das Metrópoles.