Em artigo para o site Justificando¹, Leonardo Cisneiros (professor na Universidade Federal Rural de Pernambuco, integrante do grupo Direitos Urbanos e do movimento Ocupe Estelita) fala sobre o programa para financiamento das universidades brasileiras recentemente apresentado pelo Ministério da Educação, o Future-se.
No texto, Cisneiros destaca um aspecto da proposta ainda pouco analisado: a possibilidade de utilização dos imóveis da União como fonte de financiamento para as universidades. Os terrenos, supostamente ociosos, poderiam ser utilizados para a construção de empreendimentos que gerariam renda por meio de aluguéis.
Future-se: a universidade a serviço da especulação imobiliária
Leonardo Cisneiros
Após ter gerado uma série de manifestações nacionais de protesto por ter promovido um corte de recursos no orçamento da educação superior, o MEC (Ministério da Educação) apresentou o Future-se, programa para financiamento das universidades brasileiras. A proposta, anunciada em julho deste ano, foi construída sem qualquer conversa preliminar com as comunidades universitárias, além de ser confusa e ter muitas inconsistências.
O projeto tem gerado polêmica e provavelmente teve sua origem influenciada pela familiaridade do ministro da Educação e do secretário de Ensino Superior com o setor financeiro. Neste contexto, é importante atentar para um aspecto que ainda não recebeu destaque suficiente e pode ter repercussões para além dos muros das universidades. Trata-se da proposta de utilizar os imóveis da União, supostamente ociosos, como fonte de financiamento para as universidades. Os terrenos poderiam ser utilizados para a construção de empreendimentos que gerariam renda por meio de aluguéis.
Segundo dados apresentados pelo MEC, um valor estimado em R$ 50 bilhões em imóveis públicos poderia ser utilizado como aporte para integralizar cotas em fundos de investimento imobiliários privados. Esses fundos, produto cuja comercialização na Bolsa teve uma grande expansão após 2009, geram rentabilidade pelo investimento direto em imóveis para aluguel ou pelo investimento em outros títulos financeiros do mercado imobiliário, como letras do crédito imobiliário ou os CEPACs (Certificados de Potencial Adicional de Construção) das Operações Urbanas.
O funcionamento destes produtos foi explicado de forma detalhada pelo secretário de educação superior do MEC, Arnaldo Lima Jr, em uma entrevista ao HuffPostBrasil. Ao mencionar que investidores “de mais de 20 países” têm ido ao MEC para demonstrar interesse em investir em residência estudantil em áreas próximas às instituições universitárias, o secretário quase cometeu o que poderia ser considerado um ato falho sobre o real teor da proposta. Na sua avaliação, este tipo de empreendimento “pode dar um retorno de curtíssimo prazo para as universidades como forma de aluguel”.
A proposta desconhece que moradia estudantil, assim como o restaurante universitário e as bolsas de permanência são medidas dirigidas justamente ao público mais carente das nossas universidades e deveriam ser gratuitas ou, pelo menos, fortemente subsidiadas. O plano cogitado pelo MEC transforma a moradia estudantil em mais uma mercadoria e faz com que, para completar um orçamento cada vez mais apertado, as universidades tenham que se alinhar aos interesses de investidores na captura da renda fundiária. O subsídio aos estudantes carentes é colocado em conflito direto com os outros objetivos da universidade e não haveria espanto se, para complementar o pacote do capitalismo sem riscos, surgisse a sugestão de um subsídio via vouchers. Esse conflito de interesses pode se estender ainda mais e afetar as atividades de pesquisa. Como as áreas que estudam de forma crítica o processo de urbanização serão impactadas por medidas que permitem que a universidade seja financiada pelo mercado imobiliário?
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¹ O texto faz parte da coluna “Questões Urbanas”, produzida pelo IBDU e BrCidades.