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O Laboratório de Estudos da Habitação (LEHAB) da UFC, que integra o Núcleo Fortaleza do Observatório das Metrópoles, participou da 2ª Conferência Municipal de Habitação de Fortaleza, realizada no final de janeiro de 2016. O evento resultou em uma conquista para os movimentos populares que aprovaram a reativação do Conselho Municipal de Habitação Popular – parado desde 2009. Neste texto a equipe do LEHAB relata os resultados da Conferência, o debate sobre as ZEIS e as 30 propostas aprovadas para a política habitacional do município.

O LEHAB/UFC foi um importante ator político 2ª Conferência Municipal de Habitação de Fortaleza: atendendo a um encaminhamento do 3​o Encontro de Comunidades pelo Direito à Moradia,​ o laboratório realizou uma o​ficina de preparação para os delegados dos movimentos sociais e demais interessados no dia 23 de janeiro,​com o objetivo de informar sobre a finalidade da Conferência e a atuação do Conselho, assim como construir pautas e diretrizes para cada um dos eixos temáticos.

Representado pelo professor de Arquitetura e Urbanismo Renato Pequeno, coordenador do laboratório, o LEHAB participou do encontro sobre habitação como segmento acadêmico e foi eleito titular do grupo na gestão trienal (2016­2019) do Conselho Municipal de Habitação Popular, tendo a Universidade de Fortaleza como suplente. “Nos colocamos à disposição para o debate para que esta representação se faça efetivamente como reverberação de muitas vozes”, destacaram os integrantes do LEHAB.

A participação do LEHAB é uma atividade associada ao projeto “Estratégias e instrumentos de planejamento e regulação urbanística voltados a implementação do direito à moradia e à cidade no Brasil – avanços e bloqueios”, realizado pelo Observatório das Metrópoles em parceria com a UFC e a USP, apoiado pela Fundação Ford e pelo CNPq.

No texto a seguir ​“Conselho Municipal de Habitação Popular é reativado por movimentos populares”, redigido por Bruna Forte, a equipe LEHAB relata o debate realizado na 2ª Conferência Municipal de Habitação de Fortaleza, a luta pelo direito à cidade e à moradia, e o fortalecimento dos movimentos populares como importante grupo para a construção de cidades mais justas.

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​Conselho Municipal de Habitação Popular é reativado por movimentos populares

2a Conferência Municipal de Habitação foi realizada em Fortaleza no final de janeiro e reuniu 250 delegados para debater política habitacional

Por Bruna Forte (LEHAB)

Aglomerados urbanos, moradias precárias e dispostas desordenadamente em situação de risco, aluguéis caros, dezenas de conjuntos habitacionais em situação irregular. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2013, Fortaleza possui um d​éficit de 102,1 mil habitações, um dos maiores do país. Para discutir a política habitacional da cidade e o direito à moradia digna, a 2a Conferência Municipal de Habitação foi realizada nos dias 29 e 30 de janeiro deste ano, reunindo cerca de 250 delegados na Universidade do Parlamento Cearense, localizada na Assembleia Legislativa. Com a presença de 120 representantes dos movimentos populares, a reativação do Conselho Municipal de Habitação Popular (Comhap) foi aprovada durante o evento.

A 2a Conferência Municipal de Habitação somou movimentos populares e sociais, entidades profissionais e acadêmicas, sindicatos patronais e de trabalhadores e o poder público em cinco eixos de discussão: 1) Desenvolvimento urbano e Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS); 2) Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS), regularização fundiária e vazios urbanos; 3) Programas habitacionais e interlocuções sociais; 4) Financiamento da política habitacional e 5) Comissão de conflitos fundiários. Na sexta­feira, primeiro dia de reunião, uma palestra­magna foi apresentada e o regimento interno da Conferência foi aprovado, garantindo que as assertivas votadas servirão tanto para a política habitacional quanto para o funcionamento do Comhap. Já no sábado, as propostas dos segmentos foram lidas, debatidas e votadas. Ao final, 30 propostas relacionadas à habitação foram construídas.

Apesar de executada pela Secretaria Municipal do Desenvolvimento Habitacional (Habitafor) em parceria com o Instituto de Planejamento de Fortaleza (Iplanfor), a Conferência não contou com efetiva participação do poder público e o prefeito Roberto Cláudio (PDT) sequer participou do evento. O​s movimentos populares, as ONGs e a academia, no entanto, organizaram­se no Grupo de Trabalho para garantir as pré­conferências como espaços mais populares.

O Laboratório de Estudos da Habitação (LEHAB) da UFC, que integra o núcleo de Fortaleza do Observatório das Metrópoles, foi um importante ator político nesse contexto: atendendo a um encaminhamento do 3​o Encontro de Comunidades pelo Direito à Moradia,​ o laboratório realizou uma o​ficina de preparação para os delegados dos movimentos sociais e demais interessados no dia 23 de janeiro,​com o objetivo de informar sobre a finalidade da Conferência e a atuação do Conselho, assim como construir pautas e diretrizes para cada um dos eixos temáticos. Representado pelo professor de Arquitetura e Urbanismo Renato Pequeno, coordenador do laboratório, o LEHAB participou do encontro sobre habitação como segmento acadêmico e foi eleito titular do grupo na gestão trienal (2016­2019) do Conselho Municipal de Habitação Popular, tendo a Universidade de Fortaleza como suplente. “Nos colocamos à disposição para o debate para que esta representação se faça efetivamente como reverberação de muitas vozes”, destacaram os integrantes do LEHAB. A participação do LEHAB é uma atividade associada ao projeto Direito à Cidade: Fortaleza, apoiado pela Fundação Ford e pelo CNPq.

Moradora do Lagamar há 25 anos, Adriana Gerônimo participou da Conferência como delegada no segmento ONG pela Fundação Marcos de Bruin, organização que acompanha o processo de regulamentação da ZEIS do bairro. “A conferência foi positiva porque conseguimos participar da formação dela. A Fundação, o LEHAB, a Federação de Bairros e Favelas, o Movimento dos Conselhos Populares (MCP) e outras entidades entraram no GT de organização da Conferência e assim construímos uma cara mais voltada para o povo. A formação no sábado anterior também foi importante, pois a gente tirou demandas dos cinco eixos, construiu um relatório, se preparou e distribuiu as pessoas. Essas demandas são prioritárias para as políticas habitacionais e para o Conselho, que deve fiscalizar a execução delas”. Adriana, contudo, criticou a ausência das autoridades públicas e a desorganização da Habitafor: “A ausência prefeito me parece falta de prioridade, falta de valor da Conferência para ele, pois ele vai inaugurar até brinquedos em praças municipais, mas não aparece em momento fundamental como esse. Também acho que o evento foi mal divulgado ­ a participação popular poderia ter sido bem maior. Observei uma falta de organização dos documentos por parte da Habitafor”.

A 1a Conferência Municipal de Habitação ocorreu em abril de 2007, há quase nove anos, ainda na gestão da prefeita petista Luizianne Lins. Na ocasião, o Comhap foi instalado, mas o órgão estava desativado desde 2009. A expectativa é que agora o Conselho exerça uma gestão democrática e popular.

Conselho Municipal de Habitação Popular

As funções do Comhap são fiscalizar e ajudar a gerir o Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social (FMHIS), participar do planejamento e do gerenciamento do Fundo de Terras, mediar a interlocução entre poder público e a população, evoluir na construção da Política e do Sistema Municipal de Desenvolvimento Habitacional, indicar prioridades orçamentárias à Habitafor, monitorar o cadastramento geral de todas as casas entregues aos beneficiários e convocar a Conferência Municipal de Habitação. O órgão é colegiado e deliberativo, ou seja, tem poder de voto nas decisões municipais. Sendo assim, a presença de delegados da sociedade civil é uma importante ferramenta de controle popular na atuação do conselho.

“A gente está apostando no Comhap porque, diferente de outros conselhos, ele é deliberativo, então tem poder de decidir e legitimar ações e votar orçamento. A gente pode, por exemplo, priorizar os orçamentos de habitação, entendendo a possibilidade de construir unidades habitacionais sem ser apenas pelo programa Minha Casa, Minha Vida, já que o governo o utiliza como a única solução para o problema habitacional e nós sabemos que não é. Acreditamos que é importante essa retomada do Conselho para que nós possamos também estabelecer quais são as prioridades de moradia hoje”, afirmou Adriana. Ela participou da Conferência no eixo que discutiu a regulamentação das ZEIS e foi eleita delegada para o triênio do Conselho.

Adriana ressalta que o desafio agora é fazer valer todo esse longo processo e fiscalizar o acordado. Integrante também do Fórum Permanente da ZEIS no Lagamar, ela relembra que a Prefeitura se comprometeu, no mês de novembro do ano passado, em determinar uma rubrica orçamentária para as Zonas Especiais de Interesse Social na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2016, mas isso ainda não aconteceu. “Uma das propostas aprovadas na Conferência foi a prioridade das ZEIS na LOA e a efetivação das assessorias técnicas”, finalizou.

Direito à moradia digna

As 30 propostas aprovadas durante a 2a Conferência de Habitação prevêem medidas para a política habitacional do município, com o objetivo de promover moradia digna a todas e todos. Além da reativação do Comhap, uma outra proposta importante pactuada diz respeito às Operações Urbanas Consorciadas, instrumentos presentes no Estatuto das Cidades, mas que têm beneficiado prioritariamente o setor imobiliário.

Para regularizar essas parcerias público­privadas (PPP), estabeleceu­se no evento que todas as contrapartidas do Estado para essas operações devem ser obrigatoriamente destinadas a ações de melhoria habitacional, regularização fundiária e urbanização das comunidades no entorno, as quais devem entrar no perímetro da operação para receber o benefício. Além disso, agora o Comhap deve deliberar sobre a aprovação ou não de PPP propostas.

Para Sharon Dias, geógrafa e pesquisadora do LEHAB, essas propostas foram um avanço. A professora da FASETE, no entanto, lembra que moradia digna é muito mais do que fornecer casa. “A política habitacional tem o eixo de produção habitacional que é muito importante, porque tem gente que precisa de casa ­ está morando de aluguel, em co­habitação, está em situação de rua. E também tem o eixo da melhoria habitacional, que a gente vê que vem se perdendo ao longo do tempo.

Há comunidades em que as pessoas têm suas casas, mas muitas vezes o banheiro não está adequado, não há salubridade, precisa de uma reforma de telhado… Essa pessoa não precisa entrar na conta do d​éficit habitacional, ela pode receber um programa de melhoria habitacional, como kit sanitário e reforma da fachada, e ter sua moradia integrada ao território. Acho que isso é bem interessante. Um outro programa que já existe é o de regularização fundiária, que provê o que a gente chama de ‘papel da casa’, a escritura que garante a segurança da posse da sua casa, mas a regularização fundiária deve ocorrer associada a outros programas. Se precisar de uma melhoria habitacional para aquela moradia, isso deve ser feito também. É importante reforçar que o trabalho social deve ser feito antes, durante e depois da implantação de novos empreendimentos”, esclareceu.

A aplicação dos instrumentos urbanísticos é fundamental para democratizar a cidade. “IPTU progressivo, tornar imóveis vazios habitáveis, por exemplo”, cita Sharon. “Esses instrumentos existem para que a gente tenha a oportunidade de reduzir o d​éficit habitacional e promover moradia digna sem necessariamente estar só construindo novas casas em terrenos dispersos na periferia da cidade. O centro da cidade, por exemplo, tem vários imóveis vazios. Há áreas interessantes na cidade em que os terrenos são subutilizados ou estão sem uso, há as ZEIS. Somando essas ações nós podemos ter uma política mais efetiva e que atenda às diferentes necessidades”, concluiu.

Vale destacar ainda que, por ocasião da 2a Conferência de Habitação, foi aprovada quase que por unanimidade uma moção pelo fim da Comissão Permanente do Plano Diretor (CPPD) e a criação urgente do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano, já que a CPPD tem assumido indevidamente atribuições desse conselho e tomado decisões contrárias aos interesses da cidade.

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